O juiz Marcelo Pimentel, da 10ª Vara Cível de Vitória, condenou o Banco Itaú a pagar R$ 60 mil por danos morais a um cliente que foi impedido, na porta giratória, de entrar em uma agência da Praia do Canto, em Vitória, em julho de 2013. O cliente, que vai ser indenizado, é o procurador de Justiça do Ministério Público do Estado do Espírito Santo (MP-ES) Alexandre José Guimarães. Na ação, ele alegou ter sofrido discriminação racial e constrangimento ilegal.
Segundo os autos da ação de número 0002312-87.2014.8.08.0024, protocolada em janeiro de 2014, o cliente Alexandre Guimarães foi chamado pela gerente de sua agência bancária para que comparecesse ao local para a realização de cadastramento biométrico. No entanto, ao chegar ao banco, ele foi impedido de entrar na agência após colocar o celular e as chaves no local indicado para passar na porta giratória.
De acordo com o processo, o procurador de Justiça foi submetido a uma série de perguntas na porta de entrada do banco, e obrigado a mostrar seus documentos pessoais, inclusive seu cartão, demonstrando ser cliente, para que os vigilantes autorizassem sua entrada no estabelecimento.
Mesmo com a exigência realizada, continuou aguardando do lado de fora e disse aos vigilantes que não poderia ser obrigado a mostrar seus documentos para adentrar ao banco, e pediu que sua gerente fosse chamada.
Segundo o cliente, até a chegada da gerente, os vigilantes agiam “de forma truculenta, com as mãos sobre as armas de fogo para intimidá-lo, e permaneceram prostrados frente à porta, falando em tom de ameaça, deboche e escárnio”.
Acrescentou que até mesmo “o gerente do banco, com total despreparo, usando do mesmo tom sarcástico e arrogante, falou que era necessário mostrar os documentos” exigidos pelos vigilantes. Alexandre Guimarães se revoltou ainda mais quando, mesmo estando horas aguardando para entrar no banco, a gerência do Itaú autorizava a entrada de várias pessoas sem que fosse necessária apresentação de qualquer documento, afirmando então ter sido vítima de discriminação.
Por isso, o cliente ajuizou a Ação de Indenização por Danos Morais contra o Banco Itaú para fazer valer seus direitos de ser indenizado pelos danos morais sofridos, os quais tiveram repercussão internacional, requerendo indenização no quantum de R$ 500 mil.
O banco fez sua contestação, em que balizou a extensão do dano e revelou que “casos semelhantes ofereceu a importância de R$ 1.998,74.”
No julgamento do mérito, o juiz Marcelo Pimentel ressalta que o cliente Alexandre Guimarães, a fim de provar os fatos constitutivos de seu direito, colacionou aos autos, Boletim de Ocorrência Policial, várias reportagens dos portais de notícia de expressão nacional que divulgaram o caso, bem como um CD com reportagens de TV, e documento que mostra o horário que o banco funciona. Juntou ainda a filmagem obtida por meio de ação cautelar, para demonstrar a veracidade dos fatos alegados nos autos.
Em contestação, o Itaú alegou que não foi tentada a solução prévia pelo cliente, registrando que tentou firmar acordo assim que soube da existência da ação, porém restou infrutífera. Acrescentou ainda a necessidade de aplicação do princípio da razoabilidade na valoração do dano.
O magistrada salienta, entretanto, que em momento algum “o réu (Itaú) nega o direito do demandante (cliente) em ser indenizado, na verdade alegou que tentou evitar ou minimizar os danos e prejuízos sofridos pelo autor, para recompô-lo, o que deixa evidente que não resistiu à pretensão do requerente.”
Desta forma, registra o juiz Marcelo Pimentel, não há fatos controvertidos na presente ação, “pois não houve impugnação sobre nenhum dos episódios relatados na peça vestibular, pois, a peça de defesa restringe-se apenas a pedido de condenação por danos morais em valor razoável, de acordo com a extensão do dano.”
Para o magistrado, “não há como negar” que o cliente “passou por um grande constrangimento, humilhação e vergonha quando foi impedido de adentrar ao banco, sem nenhuma razão, uma vez que todas as pessoas transitam livremente pela instituição financeira, entrando e saindo sem nenhuma dificuldade, enquanto o requerente esperava uma providência do lado de fora do banco, por horas, conforme se percebe nas filmagens.”
O juiz Marcelo Pimentel salienta mais: “É irredutível o direito do autor de receber indenização pelos danos morais sofridos, não somente por ter sido impedido de entrar ao banco, em razão da discriminação sofrida, mas também pelo fato dos funcionários da empresa se mostrarem totalmente despreparados, levando o autor ao passar por uma dor psicológica em virtude do tratamento a ele conferido na frente de todos que utilizaram o banco naquele horário e local. Teve o demandante, sua dignidade ferida pelos funcionários do BANCO ITAÚ, que empregaram tom sarcástico e ainda tentaram-no intimidar segurando a arma de fogo em coldre.”
Para o juiz, deve a indenização ter por base não apenas a reparação do dano causado à dignidade e a moral do cliente, por ter sido discriminado, “devendo também ser fixado o quantum levando em consideração o caráter punitivo da indenização, para que o réu passe a preparar melhor seus funcionários para uma boa prestação de serviço aos clientes”.
O magistrado ensina na sentença que “a doutrina e jurisprudência atuais são pacíficas no entendimento de amparar, mediante reparação pecuniária, aquele que sofre dano moral, que tem a sua honra denegrida de alguma forma perante a sociedade, pois os atributos do ser humano, as virtudes que o adornam e dignificam são seus valores espirituais, os valores da honradez, do bom nome, da personalidade, dos sentimentos de afeição, enfim, todo um patrimônio moral e espiritual de valia inestimável. Qualquer atentado a esse patrimônio deve ser ressarcido da melhor forma possível.”
E acrescenta: “A honesta fama é um patrimônio, da mesma forma que a honra é prerrogativa motivada pela probidade da vida e dos bons costumes virtudes estas inerentes ao caráter do autor.”
Segundo Marcelo Pimentel, “o que se observa no caso em tela é que o autor sofreu uma série de atos que atentaram contra sua boa fama, seu nome e sua reputação, isso porque foi privado de exercer o direito de entrar na agência bancária em que foi chamado a comparecer, por pura discriminação dos funcionários do banco demandado. Devo considerar ser o autor notório no seio social como Procurador de Justiça e Professor, reconhecido por sua integridade e respeitabilidade profissional. Não há de se esquecer que o autor ficou durante horas na porta da agência bancária, passando por todo tipo de constrangimento e humilhação, impedido de adentrar na agência do qual é correntista.”
Por outro lado, o juiz destaca que a discriminação pode ser sucintamente conceituada como o tratamento menos favorável a alguém com base em vários fatores, “como sua pertença a um determinado grupo, sua aparência, sua etnia, sua raça, sua nacionalidade, sua religião, e etc.”
“Pelo exposto, considero como danoso tal ato, ensejando, portanto, a reparação a título de danos morais, motivo pelo qual condeno o requerido ao pagamento da quantia de R$ 60 mil, com base na razoabilidade, pois entendo este valor como sendo suficiente para reparar os danos causados a moral do autor, bem como, entendo ser suficiente para cumprir o caráter punitivo da indenização. Deixo de tecer outros comentários, eis que supérfluos, ante o esgotamento da matéria versada nos autos”, finaliza o juiz Marcelo Pimentel.
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