O ano de 2014 foi bastante positivo, mais uma vez, para a Polícia Federal. Seus integrantes deflagraram, dentre outras, a Operação Lava Jato, que desarticulou um esquema criminoso com atuação dentro da Petrobras, a maior estatal brasileira. Foi o ano em que a PF registrou o maior número de prisões desde 2011 e o que culminou na maior operação, em volume de prisões, desde 2010. São 286 operações, que resultaram na prisão de 2.137 pessoas. Entretanto, para quem pensa que as investigações sobre roubo de bilhões de reais na Petrobras se esgotam com a prisão de lobistas, empresários e executivos da estatal e de grandes empreiteiras, se engana. Vem chumbo grosso por aí em 2015, com o alvo sendo políticos. Novas investigações vão atingir quem roubou dinheiro também de outras estatais. Quem garante é o presidente da Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal (ADPF), Marcos Leôncio Ribeiro, em entrevista exclusiva ao Blog do Elimar Côrtes.
Apesar das dificuldades financeiras impostas à Polícia Federal pela política de cortes e contingenciamentos do governo da presidente Dilma Roussef (PT), a instituição vai manter o foco no combate à corrupção: “É difícil para um policial federal, depois de apurar no seu trabalho tantos desvios de recursos decorrentes desse vigente modelo político de coalizão partidária, compreender de que ele será vítima da austeridade cobrada por um governo com 39 ministérios”, desabafa o delegado de Polícia Federal Marcos Leôncio Ribeiro.
O líder da categoria de delegados federais comenta ainda sobre os desdobramentos da Operação Lava Jato, desencadeada pela Polícia Federal em 2014 e que desarticulou uma quadrilha de empresários, executivos da Petrobras e lobistas ligados à classe política, responsável pelo desvio de bilhões de reais dos cofres da maior estatal do País:
“A Petrobras, como um patrimônio nacional, sairá mais forte desse episódio de sua história institucional…Para o bem e sobrevivência da própria companhia, haverá mais rigor no desenvolvimento e respeito às regras de controle interno, auditorias independentes e medidas preventivas contra a ‘partidarização’ da empresa e uma relação de mais transparência com seus parceiros e fornecedores”, diz Marcos Leôncio, que alerta: vem mais chumbo grosso aí contra os corruptos e corruptores que roubam dinheiro dos cofres públicos.
Blog do Elimar Côrtes – O que representa para a sociedade o golpe que a Polícia Federal está dando no esquema de desvio de dinheiro na Petrobras?
Marcos Leôncio Ribeiro – A Petrobras, como um patrimônio nacional, sairá mais forte desse episódio de sua história institucional. Com a “delação” de como operava o esquema de irregularidades na estatal, para o bem e sobrevivência da própria companhia, haverá mais rigor no desenvolvimento e respeito às regras de controle interno, auditorias independentes e medidas preventivas contra a “partidarização” da empresa e uma relação de mais transparência com seus parceiros e fornecedores.
Para as empreiteiras, o que se espera é uma mudança de cultura. Que, assim como a Petrobras, também repensem suas práticas negociais, não tolerando entre elas a “cartelização” e a corrupção com agentes do Estado.
Com relação aos partidos, a urgência de uma reforma política mais uma vez fica evidenciada. Enquanto a classe política resiste, ao menos já é motivo de aplausos a recente Resolução do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) de quebrar o sigilo bancário dos partidos políticos, separando “caixa 1 do caixa 2” com a obrigatoriedade de identificação dos depositantes.
– Por enquanto, foram atingidos empresários e intermediários da corrupção. Quando os políticos começarem a ser atingidos pelas investigações, a Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal teme por represálias contra delegados e demais investigadores da PF?
– Ao longo dos anos, o trabalho da Polícia Federal tem se relevado numa atuação republicana que não está a serviço de proteger ou perseguir partidos. Isso é motivo de reconhecimento inclusive entre a classe política. Na vida pública não se tolera é a instrumentalização e má-fé para prejudicar adversários, mas o trabalho sério é respeitado. A PF opera na linha que limita o lícito e o ilícito, quem ultrapassa esse limite assume o risco de acordar com policiais federais na porta de sua casa.
– Se houver represália, qual vai ser a posição da ADPF?
– A Polícia Federal, assim como a Petrobras, é um patrimônio do povo brasileiro. Cabe, portanto, à sociedade sair em sua defesa, quando ameaçada. É a confiança e a vigilância de todos nós, brasileiros, que trazem autonomia para a Polícia Federal. À ADPF cabe neste contexto ficar vigilante e denunciar eventuais represálias por conta da PF haver cumprido com a sua missão institucional.
– O senhor diria que 2014 foi o grande ano da Polícia Federal no combate às organizações criminosas infiltradas nos poderes?
– O ano de 2014 salta aos olhos por conta da Operação Lava Jato que, sem dúvida, já é um dos melhores e mais relevantes trabalhos da Polícia Federal. Todavia, o ano foi especialmente marcado pela realização de mais operações e prisões ainda que o investimento na PF tenha caído ao patamar de 2003. Isto é, ainda com limitações orçamentárias e financeiras e dificuldades na gestão policial, um trabalho bem feito e reconhecido pela sociedade, como a Lava Jato, serve como um fator motivacional para superar eventual desânimo profissional com a desvalorização pelo qual passa o trabalho policial.
– O que a sociedade pode esperar para 2015?
– O ano de 2015 será marcado pela apuração de fatos da Lava Jato relacionados às autoridades com foro privilegiado junto ao STF (Supremo Tribunal Federal), além de desdobramentos de semelhantes esquemas nos demais setores de infraestrutura do País. A sociedade pode esperar que mesmo diante de cortes e contigenciamentos de verbas na PF, o combate à corrupção será prioridade ao menos entre os policiais federais.
– O que a Polícia Federal perde com o veto da presidente Dilma Rousseff de parte da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) que autorizava em favor da Polícia Federal o início de construção, ampliação, reforma, aquisição, novas locações ou arrendamentos de imóveis residenciais funcionais em faixa de fronteira?
– Com certeza, prejudica o trabalho da PF no âmbito do supostamente prioritário plano nacional de segurança nas fronteiras, uma vez que impede as condições de trabalho adequadas na faixa de fronteira. É desestimulante para o trabalho policial verificar a falta de reconhecimento profissional. O policial federal já sofria com as suas expectativas de melhorias frustradas há mais de ano, como a indenização de fronteira aprovada em lei, mas nunca regulamentada, e agora ainda é obrigado a assistir cortes nas verbas para as unidades de difícil provimento no órgão.
– O senhor acredita que o veto presidencial pode ser algum tipo de represália contra a Polícia Federal por conta das investigações da Lava Jato?
– Não acredito nisso. Creio apenas que o trabalho da Polícia Federal seja levando segurança nas fronteiras quanto em favor de um pacto nacional contra a corrupção no País não faz parte da agenda de prioridades do governo federal, cujo foco está nos ajustes da economia.
Confesso, porém, que é difícil para um policial federal, depois de apurar no seu trabalho tantos desvios de recursos decorrentes desse vigente modelo político de coalizão partidária, compreender de que ele será vítima da austeridade cobrada por um governo com 39 ministérios.
– Atualmente, oito delegados federais ocupam cargos de secretários de Segurança Pública nos estados. O que isso representa para a ADPF?
– É motivo de orgulho, sobretudo, quando entre esses oitos, em seis estados os delegados federais foram mantidos à frente do cargo de secretário de Segurança Pública pelos novos governadores eleitos. Sinal de que o trabalho é digno de confiança e também haverá de ser reconhecido no Amazonas e Paraná.
(Crédito de fotos: Assessoria de Imprensa da ADPF)