Apesar dos esforços e dos altos investimentos do governo do Estado aplicados na segurança pública, a queda no número de homicídios em 2014 no Espírito Santo pode ser considerada pífia pelos mais críticos. Em 2013, foram registrados 1.564 assassinatos, enquanto no ano que se encerrou foram 1.531 – diferença de 33 casos. Porém, vale destacar que já é o quinto ano consecutivo que o Espírito Santo reduz a violência, voltando, em números relativos, aos patamares de duas décadas atrás, o que mostra a competência do Estado na guerra contra a violência.
Este indicador dos índices de homicídio é uma estimativa ainda não conclusiva, pendente de registro de dados finais relativos a algumas ocorrências de natureza fatal que podem ou não ser registradas como “homicídios” dentro dos critérios adotados pela Secretaria de Estado de Segurança Pública e Defesa Social (Sesp). Verifica-se uma estagnação nos altos índices de morte violenta, com uma diferença de apenas 33 mortes frente ao ano anterior (2013).
Os números deixam claro que não há mais espaço para uma política de segurança pública imediatista e sem um planejamento consistente, com falta de metas claras, incentivos aos policiais envolvidos e melhor integração entre as instituições envolvidas (Polícias Civil e Militar, Ministério Público Estadual e Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo).
Planejamento houve no governo anterior de Renato Casagrande, mas nem todo mundo aprendeu a lição, inclusive gente do próprio governo. Política imediatista, sem planejamento consistente e sem integração, foi o que se verificou nos oitos anos dos dois mandatos anteriores do governo Paulo Hartung. Equívoco, aliás, que ele não deverá mais cometer agora em seu terceiro mandato.
Os resultados alcançados em 2014 nos 78 municípios capixabas no combate à criminalidade revelam que o Estado necessita efetivamente de um estudo mais profundo para abordar o assunto. Talvez seja a hora de se realizarem pesquisas que expliquem e possam direcionar melhor as políticas públicas para o setor de segurança no Espírito Santo, injetando recursos humanos, financeiros e tecnológicos onde realmente se faz necessário.
As polícias Militar e Civil já demonstraram que, sozinhas, fica muito mais difícil reduzir a criminalidade. É necessária cada vez mais parcerias com outros órgãos do sistema de Justiça Criminal e da sociedade civil.
Os estudos a serem feitos poderão explicar o fenômeno de como na mesma Região Metropolitana da Grande Vitória os números apresentem diferenças enormes se os problemas são os mesmos. Viana, por exemplo, teve 32 homicídios em 2014. Já Cariacica, com quem faz divisa, registrou 218.
Os dois municípios, embora tenham zonas urbanas bem distintas – Cariacica tem uma população urbana bem maior –, possuem, no entanto, os mesmos problemas: tráfico de drogas e crimes de pistolagem cometidos a mando de traficantes.
Outro exemplo são os números relativos a Vitória e Vila Velha. A capital capixaba registrou em 2014 um total de 131 assassinatos, contra 229 em Vila Velha. Uma diferença de 98 casos. Tudo bem que Vila Velha tem população maior. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), são cerca de 465.690 habitantes em 2014, contra 352.104 de Vitória. Só que a população flutuante da capital é infinitamente maior, devido ao seu comércio (grandes shoppings), hotéis, centros de convenções, turismo de negócio, escritórios de grandes empresas multinacionais e repartições públicas.
Os dados comparativos entre Viana e Cariacica e Vitória e Vila Velha deixam a impressão que o Estado preventivo e repressor que atua em Viana e em Vitória é bem diferente daquele que atua em Cariacica e Vila Velha. As políticas públicas, portanto, ficam a desejar onde a criminalidade é maior.
Os números da Secretaria de Estado de Segurança Pública e Defesa Social (Sesp) desmistificam lendas, como aquelas que dizem que a violência do Rio de Janeiro, nosso vizinho, contamina o Espírito Santo. Municípios capixabas colados ao Estado fluminense são os menos violentos do Espírito Santo, embora se saiba que seja por eles que entra grande parte de drogas e armas que fomentam a indústria da criminalidade na Grande Vitória. Apiacá, Bom Jesus do Norte e Jerônimo Monteiro não tiveram nenhum homicídio em 2014.
No outro extremo, mais um mito é derrubado: Ponto Belo, na divisa com a “violenta” Bahia, também não teve nenhum assassinato no ano que passou. E o que dizer de Afonso Cláudio, município “tão temido” no passado, com fama de terra de “pistoleiros”? Registrou um assassinato em 2014.
Há algo que precisa ser corrigido na terra da Ortiz. Essa correção cabe agora a equipe da área de segurança pública do governador Paulo Hartung. A impressão que se passa para a sociedade é que a redução dos crimes contra vida é complexa e difícil, mas jamais impossível. A mesma Polícia que atua em áreas que obteve sucesso na redução deveria ser a mesma destinada a outras regiões – pelo menos no sentido filosófico dos procedimentos.
Não é possível aceitar passivamente que Vila Velha, um dos mais importantes balneários do Estado, sofra com descaso e revanche por conta de birras políticas. Não se pode imaginar que a mesma Polícia que previne, reprime e investiga a violência em Vitória não obtenha o mesmo sucesso no município vizinho.
O Espírito Santo comprova que quando os municípios – gestores públicos, como prefeitos e secretários – e as comunidades se envolvem mais na questão da segurança pública, os índices de violência tornam-se bem menos complexos para serem derrubados.
É o caso de Vitória e Viana, só para ficarmos na Região Metropolitana da Grande Vitória. Na capital, a Guarda Municipal atua em parceria com a Polícia Militar; em Vila Velha, ambas não se bicam, além de a PM contar com um efetivo bem aquém de suas necessidades. É necessário que os municípios se engajam na guerra contra a violência.
A Serra é um caso atípico, pois o seu secretário Municipal de Defesa Social, o tenente-coronel PM Nylton Rodrigues Ribeiro Filho, quando comandou o Batalhão da Polícia Militar do município, chegou a declarar para a imprensa que, em sua região, seus soldados tinham ordem para atirar somente “do peito para cima” em confronto com suspeitos de crimes.
Com esta cultura, fica difícil pedir paz à população. Resultado: em 2014, a Serra registrou 345 assassinatos, sendo o mais violento do Estado. E a Serra é, de fato, o município onde há mais policiais envolvidos em mortes com suspeitos durante confronto. Resultado de uma política equivocada e despreparada, que acaba pesando nas estatísticas oficiais do Estado.
A Serra é um exemplo cristalino de que a Polícia no Espírito Santo não fala a mesma linguagem.