A Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Espírito Santo revogou decisão de um juiz de primeira instância e decidiu que o professor Francisco Máuri de Carvalho Freitas e sua esposa, Paula Maria Albuquerque de Almeida, não vão mais a júri popular pela acusação de tentar matar o estudante Marcelo Carvalho de Santana. O TJ concluiu que não há provas suficientes para levar o casal a julgamento. Assim, o processo foi arquivado. No domingo (18/12) o crime contra Marcelo completou 12 anos.
Marcelo foi ferido com quatro tiros dentro de sua casa, em Campo Grande, Cariacica, no dia 18 de dezembro de 1999. Na época, ele tinha 19 anos, jogava futebol pelo Rio Branco, era estudante de Educação Física e tinha Máuri como um de seus professores, na Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes).
O inquérito policial que investigou o atentado contra Marcelo chegou à Justiça em agosto de 2003. Em julho de 2010 o juiz Alexandre Pacheco Carrera, da 4ª Vara Criminal (Privativa do Júri) de Cariacica, concluiu que os acusados do crime teriam que ir a júri.
Os advogados de defesa recorreram e agora acabaram de provar no Tribunal de Justiça que Máuri e Paula Maria não atiraram em Marcelo. Os advogados do casal, segundo o processo que tramitou na 1ª Câmara Criminal, foram Elisângela Leite Melo, Francisco de Assis Arapujo Herkenhoff, Felipe Caetano Ferreira e Ricardo Caiado Lima.
De acordo com a desembargadora Catharina Maria Novaes Barcellos, relatora do recurso movido pela defesa do casal, as provas apresentadas nos autos são insuficientes para levar Máuri e Paula Maria a júri popular:
“…Apesar de provada a materialidade (do crime), não existem indícios suficientes de autoria do suposto homicídio tentado, quando analisada a versão apresentada pela vítima, notadamente em cotejo com a autodefesa e os depoimentos das testemunhas, o que enseja a impronúncia dos réus”, diz a desembargadora.
Catharina Novaes Barcellos prossegue em seu voto:
“Inexistem indícios suficientes de que os acusados foram autores do suposto crime, pois carece de verossimilhança a palavra da vítima, frente às demais provas colhidas, principalmente quando não existe indício de que eles estiveram no local dos fatos, na data do evento”.
Mais adiante a desembargadora conclui, afirmando, com base no inquérito policial e nos autos do processo, que a família da Marcelo Carvalho de Santana teria sumido com o arma do crime:
“A inexatidão do horário dos fatos, o sumiço da arma de fogo pela família da vítima e a comprovada ausência de higidez mental da própria vítima à época, não tornam plausível a versão de que os réus foram os autores do suposto delito, sobretudo por ser o único indício isolado de autoria”.
A decisão que garante ao professor Máuri e Paula Maria de não irem mais a júri popular foi tomada à unanimidade pelos desembargadores da 1ª Câmara Criminal, que concordaram com o voto da relatora, desembargadora
Catharina Novaes Barcellos.
As iniciais do julgamento são: RECURSO EM SENTIDO ESTRITO – RECURSO DA DEFESA – TRIBUNAL DO JÚRI – DECISÃO DE PRONÚNCIA – ALEGAÇÃO DE OFENSA AO PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA, AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO E EXCESSO DE LINGUAGEM – INOCORRÊNCIA – HOMICÍDIO QUALIFICADO TENTADO – PEDIDO DE IMPRONÚNCIA OU ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA DOS RÉUS – ADMISSIBILIDADE – INEXISTÊNCIA DE INDÍCIOS SUFICIENTES DE AUTORIA – RECURSO PROVIDO.
Abaixo, a íntegra do voto da desembargadora Catharina Maria Novaes Barcellos:
“1) O artigo 413 do CPP estabelece que o Juiz, de forma fundamentada, poderá pronunciar o acusado, se convencido da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação. No caso, a decisão de pronúncia proferida pelo nobre magistrado não se afastou das balizas preceituadas pela destacada norma legal, uma vez que, após apreciar livremente o contexto fático-probatório, fundamentou e baseou seu decisum em prova produzida nos autos, a qual foi reproduzida após a citação pessoal dos acusados, não havendo qualquer afronta aos princípios do contraditório e da ampla defesa, visto que todos os atos e prazos processuais foram observados, tendo os réus exercido seu efetivo direito de defesa.
2) Pelos mesmos motivos, não houve excesso pelo julgador monocrático ao fundamentar e analisar as provas produzidas, pois convencido da existência de indícios de autoria suficientes para a pronúncia dos acusados, apontou em quais provas calcou seu convencimento, não se valendo de termos peremptórios para tanto.
3) Para o juízo de admissibilidade da acusação (iudicium accusationis), nos crimes de competência do Tribunal do Júri, devem estar presentes a prova da existência do crime (materialidade) e os indícios suficientes de sua autoria (art. 413, caput e § 1º, CPP).
4) Hipótese em que, mediante cognição não exauriente, apesar de provada a materialidade, não existem indícios suficientes de autoria do suposto homicídio tentado, quando analisada a versão apresentada pela vítima, notadamente em cotejo com a autodefesa e os depoimentos das testemunhas, o que enseja a impronúncia dos réus, na forma do artigo 414 do CPP.
5) Inexistem indícios suficientes de que os acusados foram autores do suposto crime, pois carece de verossimilhança a palavra da vítima, frente as demais provas colhidas, principalmente quando não existe indício de que eles estiveram no local dos fatos, na data do evento.
6) A inexatidão do horário dos fatos, o sumiço da arma de fogo pela família da vítima e a comprovada ausência de higidez mental da própria vítima à época, não tornam plausível a versão de que os réus foram os autores do suposto delito, sobretudo por ser o único indício isolado de autoria. Em sentido oposto, constam informações de que uma das testemunhas ouvidas em Juízo, confirmou o álibi dos réus, afirmando que no dia dos fatos, esteve na residência destes, localizada em local distante do evento, tornando firme a versão da defesa.
7) Recurso ao qual se dá provimento, para impronunciar os réus.
Conclusão: à unanimidade, dar provimento ao recurso.”