O governo federal, através do Ministério da Justiça e da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, editou uma portaria interministerial com novas diretrizes sobre uso da força e de armas de fogo por parte Força Nacional de Segurança, Polícia Federal (PF), Polícia Rodoviária Federal (PRF) e agentes penitenciários federais.
A medida entrou em vigor na segunda-feira (03/01), quando foi publicada no Diário Oficial da União. A intenção é tentar reduzir o número de mortes em ações policiais.
O documento não vale para as policias militares e civis dos estados e para as guardas municipais, que ficam livres para atender as diretrizes.
De acordo Isabel Figueiredo, assessora do Ministério da Justiça e integrante do grupo de trabalho que redigiu o texto da portaria, as policias estaduais receberam a sugestão de implementar as diretrizes.
“As próprias forças policiais têm dúvidas sobre os tipos de armas a serem usados em determinadas situações inesperadas, que fazem parte da rotina deles. Quanto mais normatização do uso de arma, mais seguro o policial se sente”, disse Isabel Figueiredo ao portal de notícias G1.
Entre as principais mudanças na conduta policial está a proibição do tiro de advertência e de atirar contra pessoas que esteja em fuga e desarmada, mesmo que esteja de posse de arma de menor potencial de risco. O disparo de arma contra veículos que tenham furado um bloqueio policial e o ato de apontar arma durante uma abordagem também estão proibidos.
Esse tópico das novas normas é muito importante e pode evitar tragédias. Há cerca de 10 anos, no Espírito Santo, um policial rodoviário federal feriu com um tiro um comerciante que dirigia um carro na BR-101 Sul, na altura de Safra, em Cachoeiro de Itapemirim.
O motorista não ouviu o apito do policial e nem o seu sinal e passou direto. O policial rodoviário atirou na direção do veículo e acabou acertando o tiro no motorista, que foi socorrido pelos próprios patrulheiros do posto de Safra e levado para um hospital de Cachoeiro.
Ele sobreviveu e um ano depois recebeu a visita, em casa (Vila Velha), do policial que o feriu. Os dois acabaram se tornando amigos.
Segundo determinação agora do governo federal, atirar contra uma pessoa só será autorizado em caso de legítima defesa própria ou de terceiros. De acordo com o texto da portaria, o uso da força deverá obedecer aos princípios da legalidade, necessidade, proporcionalidade, moderação e conveniência.
Para isso, o uso de armas não-letais como gás de pimenta, bastões Tonfa, coletes à prova de bala e pistolas Taser (que emitem ondas T, semelhantes às ondas cerebrais) serão incentivadas no País.
“Representantes das polícias da União e de agentes de segurança dos municípios e dos estados participaram das consulta do grupo de trabalho realizado em um ano de pesquisa. Quatorze estados participaram da confecção do texto da diretriz. O que é importante é que o Governo Federal não pode, por portaria, disciplinar os entes federados ou trazer uma obrigação para as polícias do estados e para as guardas municipais por meio de uma portaria. Isso só pode ser feito por força de uma lei”, disse Isabel Figueiredo, segundo o G1.
“O que a portaria traz, em seu artigo 3º, são mecanismos para estimular e monitorar iniciativas que tenham o objetivo de implementar essas diretrizes. Como o texto foi feito com base na oitiva das polícias dos estados e das forças municipais, o Ministério da Justiça já percebe uma iniciativa de adesão desses agentes de segurança”, afirmou a assessora do ministério.
“A adesão dos estados e municípios pode ocorrer, sem obrigatoriedade, e isso será bem aceito”, disse Isabel.
O texto foi baseado no Código de Conduta para Funcionários Responsáveis pela Aplicação das Leis, adotado pela Organização das Nações Unidas (ONU), de 1979, e também nos princípios do uso da força e de arma de fogo na prevenção do crime e tratamento de delinquentes, adotado no Congresso das Nações Unidas em Havana, em Cuba, em 1999.
Essas normas fazem parte, aliás, de um dos objetivos da Polícia Interativa, criada no Espírito Santo ainda nos anos 80.
A diretriz ainda obriga o agente de segurança pública a portar dois instrumentos de menor poder ofensivo e equipamentos de proteção, mesmo que não esteja portando arma de fogo. O texto também trata da conduta das forças de segurança caso seus próprios agentes ou terceiros sejam feridos.
“A redução da letalidade em ações policiais é uma preocupação não só das polícias do Brasil, isso é uma realidade no mundo todo. Há uma preocupação não só com a letalidade dos civis, mas como dos agentes de segurança”, disse Isabel Figueiredo.
Para adequação das corporações, foi estipulado prazo de 90 dias para as polícias da União atualizarem os procedimentos operacionais e os processos de formação e treinamento.
Além disso, elas terão 60 dias para normatizar e disciplinar o uso da força dos agentes. O monitoramento da letalidade será obrigatório. A portaria ainda estipulou prazo de 60 dias para que as corporações proponham medidas para implementação das diretrizes.