Em dezembro de 1999, estudiosos da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), delegados de Polícia Civil e oficiais da Polícia Militar se debruçaram sobre um plano de segurança pública para o Espírito Santo que veio a se chamar Programa de Planejamento de Ações de Segurança Pública (Pro-Pas), uma marca com a qual foi batizado pela excelente jornalista e marqueteira política Beth Rodrigues.
Foi, efetivamente, o primeiro e até agora único plano de segurança pública criado no Espírito Santo. O Pro-Pas foi implementado por três anos – ele entrou em vigor quase que no final de 1999. Foi um plano pioneiro no Brasil e que serviu de modelo para outros estados e até para o governo federal.
A parte mais visível do Pro-Pas eram os módulos dos corredores de segurança espalhados pelos principais eixos viários da Grande Vitória e parte do interior – o programa, todavia, tinha outros itens importantes. Uma radiopatrulha da PM ficava parada num determinado módulo sempre com dois policiais militares armados com pistolas e equipados com rádios de comunicação, inclusive os portáteis.
Servia para fazer cerco quando a guarnição era acionada. Críticos do Pro-Pas lembram que as viaturas eram proibidas de se deslocar, mas quando havia necessidade o veículo era deslocado para ampliar o cerco a bandidos.
As centenas de roubos a banco, de seqüestros-relâmpagos, de roubos a carros e outros tipos de crimes caíram extraordinariamente. Ou, depois de consumidos os crimes, logo os bandidos eram cercados e presos. Foi o tempo em que a polícia, definitivamente, era vista nas ruas e fazia do trabalho ostensivo a sua grande arma para o combate ao crime.
Em janeiro de 2003, no entanto, o Pro-Pas foi extinto, já sob a gestão do atual secretário de Estado da Segurança Pública e Defesa Social, o delegado federal Rodney Miranda. O governo atual poderia ter mantido as bases do Pro-Pas, mesmo trocando de nome para não ter qualquer vinculação com o governo anterior que teve triste fim, exceto na área de segurança pública.
Afinal, o Pro-Pas foi o único projeto que se salvou do governo José Ignácio Ferreira – que até hoje vive se defendendo na Justiça por causa de denúncias de suposta corrupção em seu governo.
Enquanto o Espírito Santo, que já exportou outro grande modelo de policiamento para outros estados brasileiros e até para outros países – que é a Polícia Interativa –, passou a ignorar o Pro-Pas, estados como o Rio de Janeiro, Minas Gerais, Mato Grosso, Tocantins e Pernambuco adotaram vários itens do programa. E esses estados conseguiram, com esse plano, reduzirem seus índices de criminalidade.
Há uma semana, o secretário Rodney Miranda anunciou mudanças em delegacias, deslocando delegados para outros postos, com a intenção de aumentar o combate à criminalidade e ajudar na redução dos índices de violência. Isto já foi feito pelo menos quatro vezes nos últimos sete anos. É mais do mesmo.
Pode funcionar em algum ponto e em determinado momento, mas o efeito será passageiro. Mudança de delegado e descentralização da Divisão de Homicídios e Proteção à Pessoa – deslocando para os municípios, como Serra, Cariacica e Vila Velha as Delegacias de Crimes contra a Vida – é um fato que vem se arrastando ao longo dos últimos anos, mas não tem dado resultado positivo.
O que ajuda, decididamente, a aumentar o combate à criminalidade e a redução dos índices de violência é colocar mais policiais ostensivos nas ruas e não seletivizar as investigações; é se unir à sociedade, aos moradores e às instituições, buscando o fim do medo coletivo e da impunidade.
Vejamos o exemplo do Rio de Janeiro, que mesmo não sendo algo inédito implantou as unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) e, através da Secretaria da Segurança Pública do estado fluminense, determinou a política de metas de redução de criminalidade. Essas duas políticas foram responsáveis por um fato histórico no Rio.
Segundo reportagem publicada recentemente pelo jornal O Globo, o número de homicídios no Estado do Rio caiu 14,4% de setembro a novembro de 2009, em relação a 2008, reduzindo a taxa para 36 mortes por 100 mil habitantes, a menor dos últimos 30 anos. Todos torcem para que, um dia, o Espírito Santo também chegue a esta marca, pois aqui a cada ano os homicídios só aumentam, chegando, segundo informa o jornal A Gazeta em sua edição desta segunda-feira (11/01), a 2.051 no ano de 2009 – macabro recorde!
O governador do Rio, Sérgio Cabral (PMDB), atribui a queda ao modelo de gestão criado a partir de estudos do Instituto Nacional de Desenvolvimento de Gestão (INDG) e do projeto desenvolvido pela subsecretaria de Inteligência da Sesp carioca, que estabeleceu metas de redução de criminalidade.
Ele cita ainda o sucesso das unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), a política de metas de segurança, a integração cada vez maior entre as polícias Civil e Militar e as ações de combate ao tráfico e às milícias.
O Pro-Pas, até o final e 2002, estabeleceu ações de ocupação permanente em bairros da Grande Vitória considerados violentos. A PM ficava instalada permanentemente nas regiões e, nos finais de semana, havia ainda o programa social voltado para as comunidades e, principalmente, com a participação dos jovens e a realização de jogos e eventos culturais, o “A Gente de Paz”, também uma marca de Beth Rodrigues.
O Pro-Pas estabelecia o cumprimento de metas. Delegados e comandantes de batalhões e companhias eram advertidos e reorientados quando, em seus municípios, não conseguiam cumprir a meta de redução de criminalidade. Assim como numa empresa privada, o poder público tem o direito e dever de fazer seus servidores cumprirem metas.
Recentemente, a PM ocupou 11 bairros, dentro do que o secretário Rodney Miranda denomina de “Ocupação Estratégica”, mas não foi uma ocupação permanente e já se encerrou, segundo informações da própria PM.
“Nossa idéia seria, num primeiro momento, levar uma grande parte da tropa para quatro bairros, sem mexer no contingente dos batalhões. A partir do momento que essas regiões começassem a ficar pacificadas, parte da tropa seria substituída por soldados que estão saindo de nossos cursos”, explicou um comandante de companhia da PM na Grande Vitória.
Em Minas Gerais, o governo criou a Superintendência de Prevenção à Criminalidade (Spec), que é, no âmbito da Secretaria de Estado de Defesa Social (Seds), a responsável pela implementação de todas as políticas públicas relacionadas à prevenção da criminalidade. Em outro artigo, vamos abordar especificamente a ZPI mineira.
Outro Estado que acaba de copiar o modelo de gestão do Pro-Pas é Pernambuco, por onde passou o secretário Rodney Miranda. Trata-se, segundo o governo pernambucano informa em seu site oficial, de um “novo modelo de policiamento”.
Ele visa implementar um modelo de gestão por resultados, com ênfase na interação e confiança entre o cidadão e o policial (nossa Polícia Interativa), com o propósito de controlar a violência e de contribuir para aumentar a sensação de segurança através do policiamento preventivo.
Com esses objetivos foi implantado no início de dezembro de 2009, em Boa Viagem, o Quadrante de Segurança da Polícia Amiga – QSPA, um neologismo para as ZPIs criadas no Espírito Santo, 10 anos antes.
Este novo modelo de policiamento é, segundo o governo de Pernambuco, mais uma alternativa para reforçar a segurança no Grande Recife. Cada bairro é dividido em quadrantes que compreendem entre 1,5 e 2,5 quilômetros de extensão e fica sob responsabilidade de uma dupla de policiais de moto e uma viatura da Polícia Comunitária – nossos módulos de segurança melhorados.
Atendendo a nova proposta de segurança, o bairro de Boa Viagem foi dividido em 11 quadrantes, onde 22 motos e 11 viaturas fazem o policiamento nos três principais corredores, as avenidas Boa Viagem, Conselheiro Aguiar e Domingos Ferreira, totalizando 198 policiais empregados no policiamento preventivo e ostensivo.
Quando se vê a polícia nas ruas, a sensação de segurança é maior. Em outro artigo futuro, vamos abordar a questão da sensação de segurança em 2002, último ano do Pro-Pas, e agora em 2009.
No governo de Anthony Garotinho, o Rio de Janeiro já havia copiado o nosso módulo de segurança. Só que lá os módulos eram chamados de Polígono de Segurança.
Portanto, neste mundo, copiar não é pecado. Podem-se copiar modelos inteligentes, mesmo que mude de nome. Só não se pode aceitar é a falta de um programa eficaz de segurança pública. Já foi provado que trocar delegados e comandantes não resolve o problema em definitivo.
Procuramos insistentemente entrevistar alguns oficiais que estiveram à frente do Pro-Pas, mas nenhum deles se propôs a dar entrevistas, pois, segundo entendem, não é hora de polêmicas uma vez que a insegurança é no “Novo Espírito Santo” um assunto ainda não resolvido.
Para concluir que estamos numa direção correta em nossa análise – sem acusar “A” ou “B”, mas apenas mostrando como uma política eficaz e competente de segurança pública faz falta a uma sociedade –, nos cercamos das análises de várias pesquisas de opiniões que revelam a aprovação popular do Pro-Pas.
É o que dizem pesquisas feitas pela Futura entre dezembro de 200 e março de 2002. Outro dado importante que mostra a queda da taxa de homicídios no Espírito Santo enquanto durou o Pro-Pas foi divulgado pela Unesco em 2002, revelando que enquanto no Brasil os homicídios cresceram mais de 50%, por aqui os mesmos números caíram 21,5% na cidade de Vitória.
Ao final de 2001, a taxa de assassinato por grupo de 100 mil habitantes, segundo dados do SUS, era de 46,32. Hoje, a realidade é outra. De acordo com os dados divulgados nesta segunda-feira pelo jornal A Gazeta, tendo como fonte a Associação dos Investigadores da Polícia Civil (Assinpol), o Espírito Santo deverá fechar 2009 com uma taxa de 61 homicídios por cada grupo de 100 mil habitantes.
Segundo a Assinpol, nos últimos quatro anos 7.769 pessoas foram assassinadas no Estado, o que equivale, segundo A Gazeta, como se um município – dentre Alto Rio Novo, Divino São Lourenço, Dores do Rio Preto, Mucurici e Ponto Belo – desaparecesse do mapa e perdesse, de uma só vez, sua população.