Em entrevista à revista Veja há quatro anos, José Mariano Beltrame, um super delegado federal que hoje é secretário de Estado da Segurança Pública do Estado do Rio de Janeiro, dizia, para espanto da sociedade brasileira, que “é diferente um tiro em Copacabana e um na favela da Coréia”.
Ele referia-se ao bairro mais famoso do Brasil, que é Copacabana, na Zona Sul do Rio, e a uma das favelas até então dominada pelo tráfico. A indignação de setores ligados aos direitos humanos contra a afirmação de Beltrame foi imediata.
Tudo que aconteceu no Rio no ambiente da segurança pública não estava acontecendo senão fossem dois grandes eventos que passarão pela Cidade Maravilhosa: a final da Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016.
José Mariano Beltrame – e todos temos que nos dobrar diante de sua inteligência política e carisma –, emparedado diante da realidade internacional que exige um controle efetivo e total do Estado sobre seu território, teve que criar políticas competentes de combate à violência, já que a insegurança foi o principal fator negativo que pesava contra a escolha da cidade do Rio como sede desses dois eventos esportivos mundiais.
Então, do limão se fez uma limonada. Era a desculpa que o governo do Estado do Rio queria para colocar o Bope (Batalhão de Operações Policiais Especiais) em ação e cumprir a frase dita no início deste artigo, atribuída a Beltrame: “´É diferente um tiro em Copacabana e um na favela da Coréia”.
Algumas questões, entretanto, têm de ser observadas. O Rio tem 1.267 favelas, mas somente 40 serão ocupadas – ou beneficiadas – pelas Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs).
O que é uma UPP? É um novo modelo de segurança pública e de policiamento que promove a aproximação entre a população e a polícia, aliada ao fortalecimento de políticas sociais nas comunidades. As UPPs representam uma importante ‘arma’ do governo do Estado do Rio e da Secretaria de Segurança para recuperar territórios perdidos para o tráfico e levar a inclusão social à parcela mais carente da população.
Neste novo formato de policiamento, o secretário José Mariano Beltrame não permite que se misturem policiais novos com os veteranos. A pergunta é: “Até quando esse formato vai persistir? Até 2016, ano das Olimpíadas?”
Outra questão chave é a seguinte: os traficantes – aqueles que pegam nas armas, porque há outros homens mais importantes na hierarquia do tráfico que ficam em suas mansões e apartamentos de luxo só financiando a compra de drogas e armas, sem ser incomodados pela lei – moram nos morros.
Já a maioria dos usuários reside nas partes nobres, no asfalto: haverá UPP nas áreas onde estão os maiores consumidores de cocaína? Quem vai atender a demanda dessa classe dominante? Ou o tráfico acabará simplesmente com a presença das UPPs nas 40 comunidades, como a imprensa carioca passou a chamar as favelas a partir da ocupação? E nos demais espaços não vigiados pelas UPPs, o que deverá acontecer?
Na edição de número 2.032, ano 40, de 31 de outubro de 2007 da revista Veja, o secretário Beltrame declarou que “é diferente um tiro em Copacabana e um na favela da Coréia”. E, perguntado pela revista, na ocasião, sobre “o que é preciso fazer para demonstrar aos bandidos e restabelecer a ordem no Rio de Janeiro”, Beltrame respondeu:
“Sei que isso é difícil de aceitar, mas para acabarmos com o poder de fogo dos bandidos, vidas vão ser dizimadas. O quadro é esse”.
Como se observa quatro anos depois, José Mariano Beltrame mudou. No último domingo, por exemplo, ele colocou a UPP dentro da Rocinha, a maior favela do mundo com mais de 100 mil habitantes, sem dar sequer um tiro.
Mostrou que os serviços de Inteligência da polícia carioca são eficientes. Conseguiu colocar os traficantes para correr das favelas – muitos já foram presos – antes das ocupações, que são previamente informadas à população.
Enfim, será que o secretário Beltrame mudou por conta dos interesses políticos e econômicos do Brasil e do Rio de Janeiro, tendo em vista a realização da Copa do Mundo e as Olimpíadas?
Uma coisa é certa: Beltrame segue a mesma rotina de outros técnicos da segurança pública que viraram políticos. Ele jura que não será candidato a nada no futuro, mas não duvidem se, em 2014, José Mariano Beltrame seja eleito governador do Rio, como sucessor do bom Sérgio Cabral.
Aliás, por sua perfomance, transformação e mudança para o bem – porque os petistas mostraram, depois que assumiram o poder, que normalmente os políticos mudam para o mal –, José Mariano Beltrame merece aspirar até mesmo a Presidência da República.
E viva a mudança de Beltrame!