Estive pela última vez com Cabo Porto naquela fatídica manhã de sexta-feira, 14 de fevereiro de 2020. Ele foi até meu escritório, no Centro de Vitória, para uma conversa sobre seu futuro político. Involuntariamente, chegou meia hora atrasado. Foi mais um surpreendido pela onda de terror espalhado por traficantes, logo após a morte de um gerente do tráfico do Complexo da Penha, numa suposta troca de tiros com policiais civis. Cabo Porto saiu de Jacaraípe, na Serra, onde residia, e acabou tentando chegar ao Centro pela Avenida Leitão da Silva.
Com aquele sorriso de sempre, que contagiava amigos e colegas, ele entrou no escritório se desculpando e dizendo, com ar juvenil:
“Aqueles moleques deram muita sorte hoje. Quando meu carro entrou na Leitão da Silva eles tinham fugido e meus irmãos da PM e da Polícia Civil já estavam dominando a avenida. Já estava com a pistola pronta para trabalhar. Graças a Deus não foi preciso”.
Assim era o cabo da Reserva Remunerada da Polícia Militar e vereador da Serra pelo PSB, Jucélio Nascimento Porto, 44 anos de idade. Incorporado na PMES em 19 de agosto de 1996, Cabo Porto era um dos maiores recordistas de elogios operacionais na história da PM capixaba. Enquanto estava na ativa – ele teve de ir para a RR em 2016, depois de ter sido eleito vereador –, Porto recebeu mais de 390 elogios em sua carreira e pelo menos 40 prêmios de “Destaque Operacional”. Era, de fato, uma máquina de trabalhar.
Fui apresentado ao Cabo Porto por outro militar: o também 3º sargento Júlio Maria, em 2016, que, na época, era o vice-presidente da Associação de Cabos e Soldados da PM e do Corpo de Bombeiros (ACS/ES).
“Eu diria que Cabo Porto, além de sério, correto, humilde e grande amigo, é uma máquina de trabalhar. É uma máquina de tirar criminosos das ruas, de ajudar a sociedade capixaba. Eu sinto orgulho de tê-lo como colega de farda e amigo pessoal”, me disse, certa vez, o amigo Júlio Maria.
O guerreiro combatente, entretanto, nos deixou. No último sábado (22/02) de manhã, Cabo Porto, sua esposa, Thatianni Gonçalves Vasconcelos, 24, e o filho do casal, João Vasconcelos Porto, de 4 anos, morreram em um grave acidente na BR-101 Norte, em Jaguaré, Norte do Estado. Eles “fugiam” do Carnaval para descansar no interior. O carro dirigido por Porto bateu de frente em uma carreta.
A família foi sepultada no domingo (23/02) à tarde, no Cemitério Jardim da Paz, em Laranjeiras, na Serra, na presença de centenas de pessoas. Policiais Militares prestaram homenagens a Cabo Porto. Amigos e familiares se emocionaram durante e aplaudiram enquanto o policial, a mulher e o filho eram sepultados.
O governador Renato Casagrande e o prefeito Audifax Barcelos também participaram dos funerais. O Estado e o Município da Serra decretaram luto de três dias pela morte do militar-vereador:
“Cabo Porto e sua família nos deixam hoje de uma forma inesperada. Além de um amigo, companheiro de partido, um político corajoso e dedicado às suas causas. Sentiremos muito sua ausência. Sigam em paz!”, disse o governador.
Cabo Porto tinha o sonho de poder se candidatar a prefeito da Serra. Mas, com os pés firmes no chão, me garantiu, na conversa que tivemos no dia 14 de fevereiro, que, naquele momento, sua intenção era mesmo a de pleitear a reeleição ao cargo de vereador.
Diferente de outros colegas com perfil político mais conservador, Cabo Porto jamais foi teimoso na ideologia que defendia. Revelou-se, na nossa conversa, uma franqueza: era defensor ferrenho do presidente Jair Bolsonaro, político ligado à direita; e ao governador Renato Casagrande, mais de centro-esquerda:
“Sempre caminhei ao lado do governador Casagrande. Entrei no PSB graças a ele, em 2016, para disputar as eleições. Mas revelo: em 2018, votei no Casagrande e no Bolsonaro. E defendo os dois onde eu estiver”, salientou Porto, na ocasião.
E assim se foi mais um jovem guerreiro, trabalhador e respeitado pelo povo que conferiu a ele os 3.080 votos que o elegeram vereador.
Cabo Porto nos deixou alguns legados. Um deles foi a humildade. Perguntado, certa vez, se se considerava um recordista de receber premiação por seu trabalho na PM, ele respondeu:
“Recordista de elogios? Não me considero recordista, pois seria uma forma de individualidade, coisa que no meu serviço jamais pode existir. Cada elogio, cada ocorrência, cada prêmio ou cada ‘Destaque Operacional’, divido com amigos que também doam suas vidas comigo. São policiais honrados que passam até mesmo horas sem beber um simples copo d´água para proteger a sociedade. Divido também com minha família e a de cada parceiro de serviço. Somos um corpo, um time que se completa”.
Outro legado foi a gratidão. “Quem foi a pessoa que mais incentivou sua carreira policial?”, perguntei ao Porto, no que ele respondeu:
“A que mais me incentivou e orientou foi minha eterna mestre em tudo: minha mãe, que, onde quer que esteja, sempre terá orgulho do filho”.