O juiz Antônio Leopoldo Teixeira foi absolvido da acusação de corrupção. O Ministério Público Estadual acusava o magistrado, que foi aposentado compulsoriamente, de receber dinheiro em troca de benefícios concedidos irregularmente a presidiários.
Leopoldo foi aposentado pelo Tribunal de Justiça em processo administrativo aberto pela Corte. Ele é também acusado de ser um dos supostos mandantes do assassinato do juiz Alexandre Martins de Castro Filho, ocorrido em março de 2003. Leopoldo nega a acusação de ter envolvimento na morte do juiz, como também sempre negou a acusação da qual acaba de ser absolvido.
Outro servidor público, Valderis Martins, que na época em que os benefícios a presos teriam sido concedidos trabalhava junto com o juiz Antônio Leopoldo na Vara de Execuções Penais, também foi absolvido da mesma acusação atribuída ao magistrado.
A sentença absolutória foi dada pelo juiz Alexandre Faria Lopes, da 9ª Vara Criminal de Vitória. “…Desse modo, face a ausência de elementos probatórios suficientes a demonstrar a efetiva prática do crime de corrupção passiva (artigo 317 do Código Penal) por parte dos denunciados, não há outro caminho a não ser absolvê-los, em razão da ausência de provas”,diz o juiz Alexandre Farina em um dos trechos da sentença.
O magistrado lembra em sua decisão que, de acordo com o Ministério Público, o acusado Valderis seria um dos intermediários entre o juiz Leopoldo “e a população carcerária e, os beneficiários do suposto crime em debate seriam pessoas físicas e até entidades religiosas”.
Outros argumentos usados pelo MP na tentativa de respaldar sua acusação são os depoimentos dos presos, dentre eles Adonirã Judson Pereira Gomes e José Raimundo de Freitas. Ambos relatam que nos presídios capixabas era de conhecimento geral que, mediante pagamento, “o primeiro denunciado – o juiz Leopoldo – concedia benefícios sem respaldo legal”.
“Contudo, o que foi dito por tais detentos não passa de um mero “ouvir dizer”, já que nenhum deles afirma categoricamente ter pago qualquer quantia e, com tal ato, ter sido agraciado com qualquer transferência de presídio ou progredido de regime em afronta à Lei de Execução Penal”, diz Alexandre Farina.
O processo deu entrada no Fórum de Vitória em 22 de fevereiro de 2008. Em certo momento, virou segredo de Justiça. Mas, em sua sentença, o juiz Alexandre Farina tornou a decisão pública por entender que não haveria mais motivo para a manutenção do segredo.
Abaixo, a íntegra da sentença que absolveu o juiz Antônio Leopoldo.
SENTENÇA
O Ministério Público, no uso de suas atribuições legais, ofereceu denúncia em face de Antônio Leopoldo Teixeira e Valderis Martins, devidamente qualificados nos autos, como incurso nas penas do art. 317, §1º (corrupção passiva qualificada), c/c art. 29, “caput”, na forma do art. 69, todos do Código Penal.
Segundo se extrai da peça vestibular:
“[…]O primeiro denunciado exerceu a judicatura da Vara de Execução Penal, 5ª Vara Criminal do Juízo de Vitória, de fevereiro de 1996 a maio de 2002, período em que alguns reeducandos do sistema prisional capixaba receberam benefícios judiciais, embora a eles não fizessem jus. Para tais desideratos, o ora denunciado contava, em algumas ocasiões, com o auxílio de terceiras pessoas, uma dela, o senhor Valderis Martins, também conhecido como Valdério, segundo denunciado. Valderis Martins ficou conhecido no meio forense como primo ou sobrinho do magistrado, embora o parentesco, consoante esse, seja de primo afastado.
As negociações entre as pessoas interessadas em liberdade mais rápida e o primeiro denunciado eram conduzidas pelo segundo denunciado, sendo que o primeiro denunciado as providenciava ainda que os pressupostos exigidos por lei para concessão dos benefícios não estivessem comprovados. Com a anuência do primeiro denunciado, Valderis Martins, segundo denunciado, solicitava quantia em dinheiro e intermediava a agilização dos expedientes na 5ª Vara Criminal, sendo então os benefícios concedidos conforme o prometido e combinado entre os ora denunciados e os interessados, reeducandos ou pessoas outras que agiam em favor desses últimos. Vantagens indevidas eram recebidas, sendo que em certas situações os ora denunciados aceitavam apenas a promessa de vantagem ilegítima, conforme investigação presentemente em curso.
Assim agindo, o primeiro denunciado infringia dever funcional, posto que o elemento subjetivo do injusto do tipo de corrupção ativa patenteava-se devido a sua condição de magistrado, cuja função primordial é a aplicação correta das leis em vigor.
Dentre os casos mencionados em documentos variados, retirados de processos e autos de investigação, apresentam-se como fundamentos da presente denúncia, o que segue:
Aos 13 de março de 1998, Manoel Correa da Silva Filho, que se encontrava preso na delegacia de polícia em Viana, neste Estado, requereu ao primeiro denunciado progressão de regime semi-aberto ao aberto, o que foi pelo magistrado despachado. O despacho, conforme documentação em anexo, encaminhava o pleito ao ministério público. Entretanto, embora contenha nos autos o carimbo de abertura de fala ao órgão fiscalizador, bem se vê que foi dado como nulo na mesma data e, ao mesmo tempo. Logo abaixo encontra-se carimbo de conclusão ao juiz, com a expressão em manuscrito, da lavra de funcionário ainda não identificado, “A pedido verbal”.
Isso se extrai da GE 8272; e mais, na mesma data surge uma sentença prolatada por outro magistrado que atuava à época também na Vara de execução Penal, concedendo a progressão para o regime aberto. No mesmo dia, pois, foi o alvará de soltura expedido e assinado pelo primeiro denunciado, e não pelo juiz sentenciante. Verifica-se que seria o Alvará de soltura assinado pelo sentenciante, juiz adjunto, mas não o foi, o que se comprova pelo risco no nome do magistrado titular, em papel timbrado, para depois recolocar o mesmo nome e ter a sua assinatura.
A rapidez desse expediente não se deu por estar o reeducando ameaçado de morte, mas sim por ter o segundo denunciado, Valderis Martins, agendada a liberdade do interessado ao preço de R$20.000,00 (vinte mil reais). Essa prática não era casual porque se constata através de dois distintos depoimentos de Manoel Correa da Silva Filho, um em julho, outro em novembro de 2002 (documentos anexos), ter pago para obter benefícios judiciais. Acentue-se que na oportunidade em que estava essa pessoa presa na casa de detenção em Vila Velha, embora já paga a “propina”, e com alvará de soltura, preferiu encetar fuga, com temor de ser morto, o que aconteceu algum tempo depois em Cachoeiro do Itapemirim.
Essa prática era de conhecimento de parte da população carcerária, a exemplo de José Raimundo de Freitas, que inclusive presenteou o primeiro denunciado com uma pintura em tela, de sua autoria, eis ser pintor consagrado. Comprova-se o fato através de depoimentos que prestou perante o tribunal de Justiça, em 2005, conforme documentos acostados. Outros reeducandos confirmam essa prática de pagamento para obtenção de benefícios, não só para a progressão de regime mas também para a transferência de estabelecimentos prisionais, o que facilitava a fugas.
Os pagamentos eram feitos, em maioria, em dinheiro em espécie; não em cheques. Todavia, não está comprovado, até agora, todos os beneficiários das propinas, isto é, entidades ou pessoas físicas ligadas aos dois denunciados.
Outro caso de corrupção por parte de ambos os denunciados teve como beneficiado o reeducando Carlos Alberto Ramos, conhecido pelas alcunhas de Antônio Carlos de Andrade, Carlinhos de Itanhenga, Carlinhos Chiquita, dentre outras.
Extrai-se das peças informativas, que aos 29 de junho de 2001, o primeiro denunciado concedeu ao reeducando o benefício do livramento condicional sem que estivessem presentes os requisitos objetivos para a outorga de tal benefício. A concessão foi efetivada sob a análise das GE`s nº 12845, nº11754, nº 7069 e nº 15401. Para conferir aparência legal à concessão do benefício, o primeiro denunciado forjou, em momentos anteriores, o atendimento da exigência do cumprimento de mais da metade da pena (art. 83, inciso II do CP), eis que o reeducando é reincidente em crime doloso. Isso se deu por meio da supressão de 03 (três) anos de pena nos momentos em que o primeiro denunciado efetivou a unificação e reunificação de todas as penas.
O livramento condicional concedido de forma irregular ao apenado Carlos Alberto Ramos foi intermediado pelo segundo denunciado em negociação na qual o primeiro denunciado recebeu “propina” em contraprestação.
Esse fato foi relatado por uma servidora pública estadual, com atribuições em assuntos profissionais, que tem conhecimento de que “Carlinhos” de Itanhega foi intermediada pelo segundo denunciado e concretizada mediante pagamento de “propina” ao primeiro denunciado. Em depoimentos prestados perante autoridades policiais a servidora ressaltou que o reeducando teve que vender uma casa e um veículo para pagar a sentença […]”.
Pedido de prisão preventiva em desfavor dos denunciados às fls. 160/163.
Decisão decretando a prisão preventiva dos denunciados às fls. 164/172.
Acórdão homologando a prisão preventiva dos denunciados às fls. 198/201.
Defesa preliminar do acusado Antônio Leopoldo às fls. 238/248.
Recebimento da defesa preliminar às fls. 254/255.
Defesa preliminar do acusado Valderis às fls. 274/284.
Acórdão recebendo a denúncia às fls. 297/298.
Decisão decretando a quebra do sigilo bancário e fiscal dos acusados às fls. 333/335.
Interrogatório do acusado Antônio Leopoldo às fls. 351/353.
Defesa prévia do acusado Antônio Leopoldo às fls. 403/404.
Interrogatório do acusado Valderis Martins às fls. 421/430.
Pedido de revogação da prisão preventiva em favor do acusado Valderis às fls. 431/432.
Defesa prévia do acusado Valderis às fls. 443/447.
Decisão indeferindo o pleito de revogação de prisão preventiva de Valderis às fls. 456/459.
Novo pedido de revogação da prisão preventiva do acusado Valderis às fls. 481/482 e decisão mantendo a custódia cautelar à fl. 493.
Sumário de acusação às fls. 494/522.
HC impetrado em favor do réu Antônio Leopoldo às fls. 808/847.
Decisão indeferindo a liminar às fls. 804/807.
Informações prestadas ao HC às fls. 849/867.
Continuação do Sumário de acusação às fls. 890/903.
Sumário de defesa às fls. 1212/1243 e 1308/1315.
Decisão do Min. Marco Aurélio revogando a prisão preventiva do acusado Antônio Leopoldo às fls. 1398/1402.
Decisão revogando a prisão preventiva do réu Valderis às fls. 1525/1527.
Alegações Finais pelo Ministério Público às fls. 2003/2042, pugnando pela condenação dos acusados nos termos dos artigos 317, §1º, c/c artigo 29, na forma no artigo 69, todos do CP.
Aditamento às alegações finais pelo Ministério Público às fls. 2259/2264.
A defesa do acusado Antônio Leopoldo apresentou suas alegações finais às fls. 2296/2357, requerendo fosse julgada improcedente a presente ação penal.
A defesa do acusado Valderis apresentou suas alegações finais às fls. 2459/2470, requerendo, preliminarmente, fosse declarada a inépcia da denúncia, a decretação de nulidade de todas as provas carreadas aos autos e, no mérito, a absolvição.
Decisão decretando a suspensão do processo até o julgamento do HC nº 97.677/ES que fora impetrado perante o Supremo Tribunal Federal. (fls. 2476/2482)
Decisão declarando nulos todos os atos decisórios proferidos após o dia 01/09/2005 e, ainda, determinando a remessa dos autos a uma das varas criminais de Vitória-ES. (fls. 2497/2501)
Decisão decretando o sigilo dos autos às fls. 2541/2544.
Interrogatório do acusado Antônio Leopoldo às fls. 2566/2572.
Interrogatório do réu Valderis Martins às fls. 2582/2584.
Defesa prévia do réu Valderis às fls. 2614/2615.
Sumário de acusação às fls. 2637/2643, sendo que na oportunidade houve conversão do ato em audiência de instrução e julgamento, na forma da lei 11719/08, com anuência das partes.
Audiência de instrução e julgamento em continuação às fls. 2660/2665, 2687/2691, 2666/2672 e 2692/2696.
Novo interrogatório dos acusados às fls. 2697/2700.
Decisão deferindo o pleito de prova emprestada às fls. 2702/2703.
Alegações Finais pelo Ministério Público às fls. 2973/2974, ratificando em todos os termos as alegações finais de fls. 2003/2042.
Alegações Finais pelo réu Valderis às fls. 2979, oportunidade em que pugnou pela sua absolvição.
Alegações Finais pelo réu Antônio Leopoldo às fls. 2981/3007, alegou não existirem provas acerca dos fatos narrados na denúncia.
É O RELATÓRIO. Passo a decidir.
Constato que foram observadas as normas referentes ao procedimento, e, de igual modo, os princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa (CF, art. 5º, LV), não havendo nulidades a sanar, nem irregularidades a suprir.
O Ministério Público imputa aos acusados Antônio Leopoldo Teixeira e Valderis Martins, o crime previsto no art. 317, §1º (corrupção passiva qualificada), c/c art. 29, “caput”, na forma do art. 69, todos do Código Penal.
Deflui do exame minucioso dos elementos probatórios que não merece prosperar, a pretensão punitiva do Estado deduzida na peça inicial.
Senão, vejamos:
O crime de corrupção passiva encontra-se previsto no art. 317 do Código Penal Brasileiro:
Corrupção Passiva
“Art. 317. Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumí-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa.
§1º. A pena é aumentada de 1/3 (um terço), se, em consequência da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou deixa de praticar qualquer ato de ofício ou o pratica infringindo dever funcional […]”.
De acordo com Cezar Roberto Bitencourt:
“A corrupção passiva consiste em solicitar, receber ou aceitar promessa de vantagem indevida, para si ou para outrem, em razão da função pública exercida pelo agente, mesmo que fora dela, ou antes de assumí-la, mas, de qualquer sorte, em razão da mesma. É necessário que qualquer das condutas solicitar, receber ou aceitar, implícita ou explícita, seja motivada pela função pública que o agente exerce ou exercerá. Não existindo função ou não havendo relação de causalidade entre ela e o fato imputado, não se pode falar em crime de corrupção passiva, podendo existir, residualmente, qualquer outro crime, tais como apropriação indébita, estelionato, etc”. (BITENCOURT. Cézar Roberto. Código Penal Comentado. 5ªed. Atual. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 1023)
No caso em tela, o Ministério Público afirma que o primeiro acusado teria, por intermédio do também denunciado Valderis, solicitado determinadas quantias em troca de benefícios concedidos irregularmente em sede de execução penal.
De acordo com referido órgão acusatório, o acusado Valderis seria um dos intermediários entre o primeiro denunciado e a população carcerária e, os beneficiários do suposto crime em debate seriam pessoas físicas e até entidades religiosas.
Aduz ainda, o Ministério Público, que o acusado Antônio Leopoldo teria realizado uma série de empréstimos suspeitos em vários estabelecimentos bancários. Todavia, não traz aos autos provas cabais a demonstrar a ilicitude de tais movimentações financeiras e, o mais importante, o vínculo entre elas e a suposta concessão errônea de benefícios.
Outros argumentos usados pelo “parquet” na tentativa de respaldar sua acusação são os depoimentos dos presos, dentre eles Adonirã Judson Pereira Gomes e José Raimundo de Freitas, ambos relatam que nos presídios capixabas era de conhecimento geral que, mediante pagamento, o primeiro denunciado concedia benefícios sem respaldo legal.
Contudo, o que foi dito por tais detentos não passa de um mero “ouvir dizer”, já que nenhum deles afirma categoricamente ter pago qualquer quantia e, com tal ato, ter sido agraciado com qualquer transferência de presídio ou progredido de regime em afronta à Lei de Execução Penal.
Senão vejamos:
JUDSON PEREIRA GOMES: “que por diversas vezes alguns presos que inclusive já chegaram a dizer para o declarante que se ele quisesse fugir era só arrumar um dinheiro para o juiz da 5ª Vara, sem dizer o nome; que o declarante pode afirmar que nesse período o Juiz era o Dr.Leopoldo […] Que nessa ocasião fugiram dois presos, um deles se chama Eduardo e que os dois deram a importância de cinquenta mil reais […]”.
JOSÉ RAIMUNDO DE FREITAS: “ que, ouviu muitos cometários dentro do presídio de que através do DR. Leopoldo se conseguia liberdades ou transferências, desde que fizesse pagamentos, nunca valores fixos, se falando entre R$5.000,00 (cinco mil reais) e R$15.000,00 (quinze mil reais) […]”.
O Supremo Tribunal Federal já se manifestou quanto a condenações baseadas em testemunhos por “ouvir dizer”:
Rel: Min. MARCO AURÉLIO – Julgamento: 02/02/1999 – Segunda Turma -COMPETÊNCIA – HABEAS CORPUS – ATO DE TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Na dicção da ilustrada maioria, entendimento em relação ao qual guardo reservas, compete ao Supremo Tribunal Federal julgar habeas corpus impetrado contra ato de tribunal, tenha este, ou não, qualificação de superior. TRÁFICO DE ENTORPECENTES – PROVA. Toda e qualquer condenação criminal há de fazer-se alicerçada em prova robusta. Indícios e o fato de se ouvir dizer que o acusado seria um traficante de drogas não respaldam pronunciamento judicial condenatório, o mesmo devendo ser dito em relação a depoimentos colhidos na fase policial e não confirmados em juízo.(grifo nosso)(…) HC 77987 / MG – MINAS GERAIS
Assim, ao contrário do que afirma o órgão acusatório, não se trata de desmerecer o depoimento daquele que está com sua liberdade de ir e vir restrita, mas, sim, justamente por tê-los como fontes de provas, valorá-los de forma imparcial, como qualquer outro meio de prova.
No mesmo sentido foram os depoimentos dos Juízes de Direito Dr. Carlos Eduardo Ribeiro Lemos e Dr. Rubens José da Cruz, ambos afirmam terem presenciado a concessão irregular de benefícios e transferências, durante o período em que dividiram com o primeiro réu a responsabilidade pela 5ª Vara Criminal de Vitória, entretanto, não existe informação de que tal concessão irregular tendo sido realizada mediante recebimento de vantagem indevida, o que em tese, configura apenas error in iudicando à época por parte do acusado.
O Ministério Público cita, ainda, o depoimento de Zilda Sonegheti de Oliveira, esta investida em cargo comissionado no âmbito do Conselho Penitenciário. Tal depoimento foi no sentido de que eram feitos pareceres favoráveis à concessão de benefícios/ transferências irregulares supostamente a pedido do primeiro denunciado.
O depoimento supracitado foi obtido mediante acareação realizada entre a servidora Zilda Sonegheti de Oliveira e o MM. Juiz Carlos Eduardo Ribeiro Lemos, ocasião em que a primeira afirmou que referido Magistrado tinha razão no que dizia.
Todavia, a acareação, é meio questionável de obtenção de prova, senão vejamos o que afirma o ilustre Eugênio Pacelli de Oliveira: “a acareação é típico procedimento de índole intimidatória. No mais das vezes, presta-se apenas a revelar um maior ou menor grau de temor de uma testemunha em relação à outra”.
Conforme se pode observar, o Ministério Público, ao longo da fase probatória, não se desincumbiu do ônus que possuía, qual seja, demonstrar de forma segura a prática do crime de corrupção passiva pelos réus. Sendo certo que referido órgão embasou a inicial em indícios, insuficientes, por si sós, a lastrear uma condenação.
Nesse sentido:
“O único fator _e principal _a ser observado é que o indício, solitário nos autos, não tem força suficiente para levar a uma condenação, visto que esta não prescinde de segurança”. (NUCCI. Guilherme de Souza. Código de Processo Penal Comentado. 9.ed. São Paulo: Editora revista dos Tribunais, 2009, p. 520)
Da mesma forma já se manifestou o Tribunal de Minas Gerais:
“Uma sentença condenatória não pode ser baseada única e exclusivamente em indícios. A prova nebulosa, contraditória e geradora de dúvida quanto à autoria do delito não tem o condão de autorizar a condenação do réu não confesso, vez que ela não conduz a um juízo de certeza. A autoria pelo apelante sinalizada como mera possibilidade não é bastante para ensejar a condenação criminal, por exigir esta a certeza plena. Como afirmou Carrara, ‘a prova, para condenar, deve ser certa como a lógica e exata como a matemática’. Nesse sentido, JTACRESP 42/323. O Estado que reprime o delito é o mesmo que garante a liberdade. O Estado de Direito é incompatível com a fórmula totalitária. Nele prevalece o império do direito que assegura a aplicação da máxima in dubio pro reo.” (TJMG -1.0000 00268370-4/000(1) – IOMG – 20/09/2002, Rel. Des. Tibagy Salles).
De acordo com o princípio da não-culpa (art. 5º, LVII da CF) não é o réu que tem que provar a sua inocência, mas sim, o titular da ação que possui a tarefa de demonstrar a sua culpa.
Nesse sentido, o ilustre professor Eugênio Pacelli de Oliveira, em sua obra Curso de Processo Penal:
“Afirmar que ninguém poderá ser considerado culpado senão após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória implica e deve implicar a transferência de todo o ônus probatório ao órgão da acusação. A este caberá provar a existência de um crime, bem como a sua autoria”.
Ainda, no mesmo sentido, Malatesta esclarece que “(…) a inocência se presume. Por isso, no juízo penal, a obrigação da prova cabe à acusação.
Ao final da instrução processual, restou claro que durante o período em que o denunciado Antônio Leopoldo esteve à frente da 5ª Vara Criminal de Vitória, vários benefícios foram concedidos a condenados que não haviam cumprido os requisitos legais exigidos para tanto.
Vale ressaltar, que constam nos autos documentos referentes à movimentação bancária das contas do acusado Antonio Leopoldo Teixeira e de sua esposa Sra. Rosilene Pereira Emerick Teixeira e nenhum desses documentos demonstram uma movimentação suspeita que pudesse levar a crer num possível recebimento irregular de valores.
Assim, verifica-se que a “mera concessão irregular de benefícios” sem a comprovação de que os réus tenham, efetivamente, solicitado ou recebido quaisquer vantagens vinculadas a tal ato, não configura crime, mas, apenas, infração administrativa.
Nesse sentido:
“ Não há se subestimar a natureza subsidiária, fragmentária do direito penal, que só deve ser acionado quando os outros ramos do direito não sejam suficientes para a proteção dos bens jurídicos envolvidos”. (STF, RHC 89624/RS, Rel. Min. Carmen Lúcia, 1ª T, DJ 7/12/2006, p. 511)
Isso porque, o direito penal só se ocupa da ofensa aos bens jurídicos mais importantes e, ainda, quando os demais ramos do direito não forem suficientes para tutela adequada.
No caso em debate, tem-se que o primeiro denunciado já fora inclusive aposentado de forma compulsória, em virtude de infrações administrativas por ele cometidas, em virtude dos mesmos fatos aqui apurados. Assim, não há motivo que justifique a aplicação do direito penal, tendo em vista que o caso já fora solucionado na esfera administrativa.
Já no que tange ao réu Valderis, em sendo ele o suposto “agenciador” da corrupção passiva levada a efeito pelo primeiro réu, sem que restasse comprovado o cometimento do crime por parte do último, restando, portanto, esvaziada, a conduta do primeiro.
De acordo com a teoria da acessoriedade limitada, esta adotada pelo Código Penal Brasileiro, para que a conduta do partícipe seja punível, necessário que a conduta do autor (protagonista da infração penal) seja típica e ilícita. O que não ocorreu no caso em debate, tornando desnecessária maiores ilações acerca da conduta do segundo denunciado.
Diante da ausência de comprovação da prática do crime de corrupção passiva pelo acusado Antônio Leopoldo, haja vista a não subsistência da prova produzida, com muito maior razão a absolvição impõe-se com relação ao segundo denunciado.
Desse modo, face a ausência de elementos probatórios suficientes a demonstrar a efetiva prática do crime de corrupção passiva (art. 317 do CP) por parte dos denunciados, não há outro caminho a não ser absolvê-los, em razão da ausência de provas.
Tanto deve ser nesse sentido que uníssona é a jurisprudência dos Tribunais deste País:
“FORMAÇÃO DE QUADRILHA. PRESCRIÇÃO DA AÇÃO PELO CRITÉRIO DA PENA ABSTRATA. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA, CUJA DECLARAÇÃO É IMPOSITIVA. CORRUPÇÃO ATIVA E PASSIVA. AUTORIA. Ausentes elementos probatórios que ofereçam segurança suficiente para a sustentação dos fatos tidos como delituosos, a absolvição é de rigor. Prescrição quanto à imputação de formação de quadrilha. Apelo não provido com transcrição da sentença”. (Apelação Crime Nº 70038620043, Quarta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marcelo Bandeira Pereira, Julgado em 17/02/2011
APELAÇÃO. PROVAS. INEXISTÊNCIA. Inexistindo provas suficientes a embasar a condenação do acusado, viável a aplicação do principio “in dubio pro reu”, ensejando em sua absolvição. Recurso improvido. (TJ-ES, Apelação Criminal, Processo nº 48070207740, Órgão Julgador: PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL; Data de Julgamento: 21/01/2009; Relator: Pedro Valls Feu Rosa, Origem: Serra – 5ª Vara Criminal)
Face ao exposto, julgo improcedente a pretensão punitiva estatal para ABSOLVER os acusados ANTONIO LEOPOLDO TEIXEIRA e VALDERIS MARTINS, das imputações que lhes são atribuídas pelo Ministério Público, como incursos nas penas do art. 317, § 1º c/c art. 29, “caput”, na forma do art. 69 todos do CPB, fazendo-o com fulcro no art. 386, inc. VII, do Código de Processo Penal.
Após o trânsito em julgado, providenciem-se as anotações e comunicações de estilo, arquivando-se o processo, observadas as formalidades legais.
Por fim, verifico que não existe mais motivos para a manutenção de segredo de justiça nestes autos, assim, determino as devidas providências para que seja retirada tal situação processual.
P.R.I.
Vitória, ES, 29 de setembro de 2011.
Alexandre Farina Lopes
Juiz de Direito
Dispositivo sentença absolutória em favor dos acusados, na forma do art. 386, VII do CPB. Registrada no Livro nº 50, às 67/80, sob o nº 158.