O corregedor geral da Polícia Militar, coronel Ilton Borges, é um oficial que não costuma passar as mãos na cabeça de seus pares. Pode até ser criticado por excesso, mas nunca por omissão e prevaricação. Acaba de dar mais um exemplo de que não comunga com injustiça e crimes na corporação. Determinou a abertura de um Processo Administrativo Disciplinar (PAD) contra um subtenente acusado de assédio sexual dentro do Quartel do Comando Geral da PM, em Maruípe, Vitória. O suboficial, que admitiu o crime – mas entendeu como “coisa normal” – corre risco de até de expulsão. Ele já respondeu a um Inquérito Policial Militar (IPM). A Polícia tem que proteger a vítima, que se sente ameaçada.
A vítima do assédio sexual é uma ex-funcionária de uma empresa terceirizada que presta serviços de limpeza e manutenção nas dependências do QCG. Outro oficial – um major PM – também foi denunciado por assédio contra a mesma mulher. Contra ele, está tramitando um processo na 4ª Vara Cível da Serra, em que a vítima do assédio cobra indenização por danos morais.
Depois do fato, a moça perdeu o emprego – foi demitida, como se fosse culpada pelo ato irresponsável do subtenente e do major. Teve de trancar até o curso de Licenciatura em Pedagogia que fazia em uma faculdade particular.
O problema na Polícia Militar do Estado do Espírito Santo é que às vezes a Corregedoria permite que oficiais ou suboficiais da mesma patente – em tese, da mesma turma – investiguem seus pares, o que pode provocar uma certa impunidade. É o que iria acontecer com o caso do subtenente acusado de assédio. Para investigar sua conduta, por meio de uma sindicância, foi designada uma 2ª subtenente, através da Portaria Nº 139/2013, de 18 de setembro de 2013, que “teve a finalidade de esclarecer os fatos e circunstâncias em torno da conduta atribuída ao SUB TEN …, lotado no Núcleo Musical da PMES.”
A moça declarou que no dia 16 de maio de 2013 foi surpreendida com um toque na altura dos ombros e por trás, seguido de um beijo na nuca, “atitude realizada pelo policial militar investigado, pessoa com quem a vítima não teria qualquer tipo de intimidade.”
A apuração da sindicância confirmou os fatos, “na maneira como foi noticiado pela reclamante.” A vítima era funcionária da empresa Prisma, prestadora de serviços de limpeza e manutenção e, na ocasião dos fatos, trabalhava nas dependências da cozinha, situada na cozinha da Banda de Música da PMES, “quando foi surpreendida com as atitudes do policial militar.”
Ainda de acordo com a sindicância, “mesmo não admitindo que chegou a encostar a boca na nuca da vítima, o policial militar não apenas confessa a atitude adotada, como também alega que teria sido um gesto normal e rotineiro de sua parte.”
Uma 1ª sargento e um 1º sargento foram arrolados como testemunhas ouvidas no Inquérito Policial Militar (IPM). Confirmaram a versão descrita pela vítima, “porém, acompanhando a interpretação do policial investigado, também avaliaram como normal a atitude do SUB TEM”.
Pior é que a encarregada do IPM concluiu que “no fato apurado não haveria indícios de prática de crime militar ou de transgressão da disciplina militar na conduta do SUB TEM…” O corregedor geral da PM, coronel Ilton Borges, entretanto, “rasgou” a conclusão da encarregada e decidiu:
1) DISCORDAR do RELATÓRIO e do PARECER da Encarregada da Sindicância, e apontar indícios de prática de crime de natureza militar e de transgressão da disciplina na conduta do SUB TEM… As atitudes do policial militar, nas circunstâncias em que foram noticiadas, jamais podem ser interpretadas como um comportamento normal e rotineiro, até porque não contou com o consentimento da vítima. Vale mencionar que o ambiente em que tudo aconteceu se tratava de local de serviço, não obrigando a funcionária a ter que suportar as atitudes inconvenientes do militar;
2) Determinar a instauração de PAD-RS, para fins de julgar a conduta do SUB TEM…;
3) Remeter os autos da Sindicância a C/4 da Corregedoria, para fins de avaliação da aplicação dos termos do art. 28 do CPPM;
4) Encaminhar os autos ao Ministério Público Estadual, na forma estabelecida pelo Decreto nº. 120-R de 30.05.2000, do Governo do Estado.
5) Publicar a presente Solução em Aditamento da Corregedoria;
6) Arquivar cópias da solução na C/3 da Corregedoria para futuras consultas.
A moça vítima do subtenente disse ter sido alvo de um outro oficial no mesmo período, em 2013. No caso do oficial, a informação é de que o IPM não conseguiu provar sua culpa. E o caso já foi arquivado na esfera da Justiça Criminal Especial.
A moça é a maior vítima de toda essa história. Perdeu o emprego e teve de trancar o curso na faculdade. Hoje, trabalha como manicure em um salão de beleza. “Mas não ganho o suficiente para retomada da faculdade”. Além disso, ela está assustada.