A Vara da Auditoria da Justiça Militar condenou o sargento PM Clemilson Silva de Freitas a um ano e cinco meses de detenção, a ser cumprida no regime inicialmente aberto, pela acusação de agredir, com um soco no rosto, um frentista que estava trabalhando em um posto de combustível na Praia de Itaparica, em Vila Velha. O crime ocorreu no dia 23 de janeiro de 2020.
De acordo com a sentença, proferida na segunda-feira (05/07) pelo juiz Getúlio Marcos Pereira Neves, o Ministério Público Militar Estadual ofereceu denúncia em desfavor do sargento Freitas, como incurso nas sanções dos artigos 209, caput, c/c 217, caput, c/c 223, caput (duas vezes), na forma do art. 79, todos do CPM, porque, no dia 23 de janeiro de 2020, no período compreendido entre 8 horas e 8h30, no Auto Posto RM, bandeira da SHELL, localizado na Rodovia do Sol, no bairro Coqueiral de Itaparica, o militar ‘injuriou’ a vítima Joélcio Rodrigues dos Santos, “mediante violência e de forma aviltante, inclusive causando-lhe lesões corporais”.
De acordo com os autos, no dia 22 de janeiro de 2020, o frentista atendeu o sargento, que teria chegado ao local de motocicleta, e ao pedir para que o mesmo descesse da moto, o que é um procedimento padrão do Posto de Gasolina, observando as normas de segurança, o militar ficou bastante alterado, culminando em uma discussão entre as partes.
Após o desentendimento, o sargento Freitas desceu do veículo e a vítima realizou o abastecimento normalmente. Entretanto, quando estava saindo do estabelecimento, o militar disse ao frentista em tom ameaçador: “AMANHÃ PASSO AÍ E QUERO VER VOCÊ PEDIR PARA EU DESCER”.
Consta ainda na denúncia que no dia seguinte, o sargento Freitas retornou ao posto de gasolina, devidamente fardado e, “valendo-se do cargo, desferiu dois golpes no rosto da vítima, com finalidade aviltante e causando-lhe as seguintes lesões, como equimose arroxeada com edema associado na região malar esquerda de cerca de 4 cm de diâmetro e ferida contusa avermelhada na região jugal de cerca de 0,2 cm de extensão”.
Prossegue a sentença, com base na denúncia do Ministério Público Militar Estadual que, “não fosse o bastante, observa-se que após desferir o primeiro golpe, o denunciado (sargento Freitas), valendo-se do cargo mais uma vez, sacou uma arma de fogo e a apontou na direção da vítima, ameaçando-a novamente. Vê-se que nos termos de reconhecimento fotográfico às fls. 42/44 e 98 a vítima reconhece com certeza o denunciado como sendo o militar que a agrediu no dia dos fatos”.
A denúncia foi protocolada em 12 de março de 2020 e acolhida um mês depois pelo Juízo Militar. Na sentença, o juiz Getúlio Marcos Pereira Neves frisa que os fatos se deram em dois dias seguidos, no mesmo local, envolvendo os mesmos intervenientes, acusado e vítima.
Pelos fatos descritos na denúncia são três os tipos penais atribuídos pelo MPM, impondo ao réu quatro acusações. Cronologicamente, observa o juiz, no dia 22 de janeiro “deu-se o entrevero entre o acusado (sargento Freitas), que estava de folga, e a vítima quando do abastecimento do veículo do primeiro”.
A denúncia informa que a exigência feita pelo frentista ao policial trata-se de procedimento de segurança. Não se conseguiu apurar se esse procedimento de segurança está sinalizado no estabelecimento; da mesma forma não se conseguiu apurar se o acusado é freguês habitual do estabelecimento, e assim deveria ter conhecimento das normas para abastecimento no local. De qualquer maneira, diz o magistrado na sentença, trata-se de procedimento de segurança padrão, visando à incolumidade do próprio condutor do veículo automotor, conforme afirma a denúncia.
A analisar todo o desenrolar do processo, incluindo as audiências e o depoimento de testemunhas, o juiz Getúlio Marcos Neves pondera que, “como a maioria dos casos de ocorrências desta natureza, o que se constatou da instrução neste ponto foi falta de bom-senso de parte a parte: o frentista, do alto da autoridade que lhe concedem as normas gerais de segurança, fez uma exigência que o acusado, do alto da autoridade que lhe concede a sua função pública, considerou descabida ou mal colocada, o que não vem ao caso”.
Porém, prossegue o magistrado: “O que vem ao caso é que, até aí, não se trata de crime militar, porque no primeiro dia, quando do abastecimento, o acusado não se encontrava em serviço, nem entrou em função, nem muito menos se estava em estabelecimento sob administração militar. No entanto, esses fatos foram o móvel do que se desenrolou no dia seguinte, quando o acusado, fardado e equipado, por se encontrar escalado e em horário de expediente, compareceu ao local para, assim agindo, dar continuidade à ocorrência sob investigação nestes autos”.
Ao contrário do que argumenta a defesa em alegações finais, pondera o juiz Getúlio Marcos Neves, “pelos fatos ocorridos no dia 23 de janeiro não há como se deixar de reconhecer a ocorrência de crime militar na espécie, na forma da alínea “c” do inciso II do art. 9.º do CPM, eis que o acusado, repita-se, encontrava-se em serviço.
Na sentença, o magistrado pondera que inicialmente é de se reconhecer em favor do acusado (sargento Freitas) a circunstância atenuante da confissão com relação ao delito do artigo 209 do Código Penal Militar (agressão), tendo negado em seu interrogatório a prática dos demais. No entanto, admitiu, também, ter atingido a vítima no rosto, sendo de reconhecer referida atenuante com relação ao delito capitulado no art. 217 do CPM, com espeque na fundamentação exarada acima.
“Por outro lado, não resta dúvida de que o acusado agiu por motivo fútil, uma vez que toda a ação desproporcional narrada na denúncia teve como causa um desentendimento por motivo de abastecimento do veículo do acusado, ocorrido no dia anterior aos fatos”, diz o juiz Getúlio Neves.
O magistrado conclui: “Não há dúvida também de que o agente agiu com abuso de poder, porquanto praticou os delitos investido da função pública que detém e utilizando-se do aparato estatal que lhe é posto à disposição por este motivo. Da mesma forma, de se reconhecer a circunstância agravante de estar em serviço, eis que, por se tratar de assunto pessoal, que nada tem a ver com o desempenho de sua função policial militar, como aliás muito bem nota a defesa, poderia ter resolvido suas diferenças em ocasião em que estivesse fora da escala de serviço, se lhe aprouvesse, o que deixaria de desafiar a competência desta Justiça Especializada, por um lado, e o reconhecimento da referida circunstância agravante, por outro”.
Dispositivos da condenação
Com relação à conduta tipificada no art. 209 do CPM:
Da análise do art. 69 do CPM, tendo em conta a gravidade do crime praticado e a personalidade do réu, considero que o dolo mostra-se exacerbado, eis que os fatos se deram no dia seguinte ao entrevero, tendo o acusado tido tempo para refletir e encerrar a discussão, em vez de dar prosseguimento às hostilidades; os motivos determinantes não o favorecem, o que será considerado na segunda fase; mostram-se as demais circunstâncias judiciais a ele favoráveis. Fixo-lhe a pena-base em 04 (quatro) meses de detenção. Havendo a considerar a circunstância atenuante da alínea “d” do inciso II do art. 72 do CPM, e as agravantes das alíneas “a”, “g” e “l” do inciso II do art. 70 do mesmo diploma legal, operada a devida compensação entre as circunstâncias e tendo em conta a preponderância das agravantes (art. 75 do CPM), elevo em 02 (dois) meses a pena aplicada, que assim Fixo em definitivo em 06 (seis) meses de detenção, em não havendo causas de aumento ou diminuição de pena a considerar.
Com relação à conduta tipificada no art. 217 do CPM:
Da análise do art. 69 do CPM, tendo em conta a gravidade do crime praticado e a personalidade do réu, considero que o dolo se mostra exacerbado, eis que os fatos se deram no dia seguinte ao entrevero, tendo o acusado tido tempo para refletir e encerrar a discussão, em vez de dar prosseguimento às hostilidades; os motivos determinantes não o favorecem, o que será considerado na segunda fase; mostram-se as demais circunstâncias judiciais a ele favoráveis. Fixo-lhe a pena-base em 04 (quatro) meses de detenção. Havendo a considerar a circunstância atenuante da alínea “d” do inciso II do art. 72 do CPM, e as agravantes das alíneas “a”, “g” e “l” do inciso II do art. 70 do mesmo diploma legal, operada a devida compensação entre as circunstâncias e tendo em conta a preponderância das agravantes (art. 75 do CPM), elevo de 02 (dois) meses a pena aplicada, que assim Fixo em definitivo em 06 (seis) meses de detenção, em não havendo causas de aumento ou diminuição de pena a considerar.
Com relação à conduta tipificada no art. 223 do CPM:
Da análise do art. 69 do CPM, tendo em conta a gravidade do crime praticado e a personalidade do réu, considero que o dolo se mostra da mesma maneira exacerbado, eis que os fatos se deram no dia seguinte ao entrevero, tendo o acusado tido tempo para refletir e encerrar a discussão, em vez de dar prosseguimento às hostilidades; os meios empregados e modo de execução, com o emprego da arma de fogo, não o favorecem; os motivos determinantes da mesma forma não o favorecem, o que será considerado na segunda fase, mostrando-se as demais circunstâncias judiciais a ele favoráveis. Fixo-lhe a pena-base em 03 (três) meses de detenção. Não havendo circunstâncias atenuantes a considerar, mas sim as agravantes das alíneas “a”, “g” e “l” do inciso II do art. 70 do mesmo diploma legal, elevo em 02 (dois) meses a pena aplicada, que assim Fixo em definitivo em 05 (cinco) meses de detenção, em não havendo causas de aumento ou diminuição de pena a considerar.
Obs: Na forma do art. 79 do CPM, e procedendo-se à unificação das penas privativas de liberdade aplicadas, fica apenado em definitivo no quantum de 01 (um) ano e 05 (cinco) meses de detenção, a ser cumprida no regime inicialmente aberto.
Atento às disposições do art. 84 do CPM, e à vista da análise a que se procedeu do art. 69 do mesmo diploma legal, concedo-lhe o benefício da suspensão condicional da pena, pelo prazo mínimo, de 02 (dois) anos, mediante observância das condições legais das alíneas “b”, “d” e “e”, do art. 626 do CPPM.
Opinião do Editor:
As alíneas “b”, “d” e “e”, do artigo 626 do Código de Processo Penal Militar dizem o seguinte: b) não se ausentar do território da jurisdição do juiz, sem prévia autorização; d) não freqüentar casas de bebidas alcoólicas ou de tavolagem; e) não mudar de habitação, sem aviso prévio à autoridade competente.
Ou seja, de acordo com a Legislação brasileira, a suspensão da pena é direito subjetivo de todo réu. A pena, no caso do sargento Freitas, fica suspensa desde que ele cumpra algumas condições impostas pelo Juízo da Execução. Se o sargento, que deu um tapa no rosto e ameaçou o frentista, cumprir as condições impostas pela Justiça, a pena dele será extinta.
Resumindo: Num País, como o Brasil,em que quem mata uma pessoa geralmente não fica preso, não vai ser um sujeito que deu um tapa no rosto de um trabalhador, em seu local de trabalho, que ficará trancafiado, né?
É preciso que os legisladores brasileiros e o próprio Governo Federal, hoje sob o domínio da família Bolsonaro, mudem radicalmente as leis criminais no País. O crime nunca pode compensar.
É necessário que, ao ser condenado a um dia prisão, o sujeito fique, efetivamente, um dia atrás das grades.