Uma semana antes de morrer, a cabeleireira Rosemary Justino Lopes, 50 anos, procurou a Polícia capixaba para denunciar que havia sofrido uma tentativa de assassinato. A autora seria a síndica do condomínio onde Rosemary residia – em Jardim Camburi, Vitória – com seu marido, o agente da embaixada da Espanha no Brasil Jesús Figón, 64.
Com vários cortes – provavelmente feitos a faca –, principalmente nos braços, Rosemary chegou a ser ouvida na 1ª Delegacia Regional (antigo DPJ de Vitória). Mas logo a farsa foi descoberta: Rosemary se automutilou na tentativa de incriminar a síndica, com quem discutiu horas antes por causa da pintura nas paredes do edifício.
O fato aconteceu no dia 5 deste mês. Rosemary foi morta a facadas no dia 12. O suspeito do crime é o seu marido, o espanhol Jesús Figón, que alega ter agido em legítima defesa. A cabeleireira morreu durante discussão. Inicialmente, no dia 5, Rosemary procurou uma viatura da Polícia Militar, em Jardim Camburi, às 17h40. Os policiais confeccionaram Boletim de Ocorrência número 24636856, descrevendo o relato da mulher.
No mesmo dia 5, Rosemary foi ouvida pelo delegado de plantão da 1ª Regional, Leonardo Ávila de Paschoa, conforme Termo de Declaração ao qual o Blog do Elimar Côrtes teve acesso com exclusividade. No depoimento, Rosemary acusou a síndica de agredi-la verbal e fisicamente. Disse que a síndica quebrou um corpo de vidro e cortou seu antebraço esquerdo de Rosemary. A síndica e uma outra moradora do edifício prestaram depoimento e desmentiram a versão de Rosemary, afirmando ter sido a cabeleireira quem agrediu a síndica com palavrões, além de ter tentado arrombar a porta da sala de seu apartamento.
Ainda no mesmo dia 5, o delegado Leonardo Paschoa encaminhou Rosemary para fazer exame de corpo delito (lesões corporais) no Departamento Médico Legal. O laudo, assinado pelo médico-legista Josias Rodrigues Westphal, revela que os cortes no antebraço de Rosemary foram feitos por “instrumento corto-contudente”, o que pode ser uma faca e não caco de vidro.
Informa ainda que foram observadas 11 lesões “corto-contusas lineares superficiais, paralelas, perpendiculares aos ossos do antebraço medindo aproximadamente 3 centímetros cada em face anterior do antebraço esquerdo”. O médico-legista concluiu o laudo informando que “o padrão das lesões sugere fortemente auto-agressão.”
O advogado do espanhol Jesús Figón, Walter Gomes, acredita que o “instrumento” usado na auto mutilação pode ser a mesma faca que acabou vitimando Rosemary:
“Penso se tratar do mesmo instrumento (faca) que a Rosemary usou para atacar o Jesús, que tem um corte no braço. Para se defender, meu cliente acabou atingindo a vítima, que veio a óbito”, disse o advogado.
O laudo preliminar da necropsia realizada no corpo de Rosemary, segundo o DML, informa que ela foi morta com cinco golpes de faca: três no tórax e dois no braço. O advogado Walter Gomes acredita, porém, que os cortes no braço tenham sido os mesmos detectados na automutilação. Por isso, a defesa espera por um laudo definitivo para ser anexado ao Inquérito Policial, que é presidido pelo delegado Adroaldo Rodrigues Lopes, da Delegacia de Homicídios e Proteção à Mulher.
DML do Espírito Santo “inova”: faz coleta de sangue durante velório da vítima e pode prejudicar produção de provas
Apesar do assassinato da cabeleireira Rosemary Justino Lopes ter tido repercussão internacional, o Departamento Médico Legal (DML) do Espírito Santo falhou. Faltou no mínimo um pouco de zelo na hora da necropsia do corpo da vítima.
A necropsia foi feita no dia 12 deste mês, sem que os médicos-legistas de plantão tivessem coletado o sangue de Rosemary para exames que detectam se ela havia ingerido bebida alcoólica – conforme declarou o marido, o espanhol Jesús, autor confesso do crime –, medicamentos controlados ou algum tipo de droga ilícita.
A coleta do sangue foi feita durante o velório de Rosemary, já no dia 13, em uma igreja evangélica do bairro Bela Vista, em Cariacica, onde residem familiares da cabeleireira. A cena com os peritos chegando ao velório para a coleta do sangue causou constrangimento entre amigos e parentes de Rosemary. Por meio de nota enviada à imprensa , a Polícia Civil informou que, de acordo com o diretor do DML, Gervásio Ambrosim, o procedimento foi feito porque, no momento da necropsia, o médico legista estava com a causa da morte esclarecida e não achou necessário colher o sangue. A Polícia Civil ressaltou que o que aconteceu no velório foi um procedimento normal.
Não, não foi! Foi, sim, na avaliação de experientes delegados, um erro que poderá provocar danos ao Inquérito Policial e prejudicar a acusação – feita pelo Ministério Público Estadual – e a defesa do espanhol Jesús. Pode prejudicar, sobretudo, a produção de provas para embasar futuras decisões da Justiça.
Para o advogado Walter Gomes, a falha do DML, que é subordinado à Superintendência de Polícia Técnico-Científica, dirigida pelo delegado Danilo Bahiense, prejudica a defesa:
“A defesa se sente prejudicada pela coleta do sangue da vítima não ter sido feita durante a necropsia, ainda no DML, e sim horas mais tarde, no velório, antes do enterro. Foi uma falha do DML. Com certeza, a não coleta do sangue no momento da necropsia e a demora de tempo para a realização do exame farão com que os indícios da presença de álcool e medicamentos na corrente sanguínea da vítima poderão ser dissipadas pela demora e falha do DML”, lamentou o advogado Walter Gomes.