Os desembargadores da 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Espírito Santo mantiveram a condenação por corrupção ativa imposta a uma acusada de tráfico, que tentou subornar policiais militares com R$ 3.300,00 – dinheiro proveniente da venda de drogas – para escapar do flagrante e deixar de ser presa.
O exemplo dado pelos policiais militares Carlos de Lecondat e Marcelo Marçal, à época lotados no 7º Batalhão (Cariacica), é digno de elogio. Num País em que a classe política, principalmente, e uma parcela pequena da polícia não contam muito com a confiança da maioria da população, os policiais Lecondat e Marçal mostraram que se pode ter uma polícia digna de respeito, que é o caso da Polícia Militar do Espírito Santo.
Andressa Rabelo foi presa pela PM no dia 28 de dezembro de 2011, junto com um adolescente de 17 anos, no bairro Itaquari, em Cariacica. Ela estava com 23 pedras de crack e com R$ 3.300,00 em espécie.
Em 8 de agosto de 2012, ela foi julgada e condenada pela juíza Eliana Ferrari Siviero, da 1ª Vara Criminal de Cariacica, a seis anos e seis meses por tráfico de drogas; três anos e seis meses pelo crime de associação ao tráfico; e dois anos por corrupção ativa.
Segundo consta no processo, durante a abordagem policial foram recebidas ligações no celular da acusada de uma pessoa que se encontrava na agenda como Baiano. Ele questionava a localização de Andressa e perguntava se ela havia entregado o dinheiro ao adolescente com quem tinha sido presa.
Por fim, quando a acusada já se encontrava no Departamento de Polícia Judiciária (DPJ) de Cariacica, em Campo Grande, seu telefone tocou e o interlocutor perguntou se ela havia comprado uma pistola e que a aguardava próximo à sua residência.
Ainda, quando da prisão, a acusada ofereceu dinheiro aos policiais para que a deixassem, valor que não foi aceito.
Por último, lembra a juíza Eliana Ferrari Siviero, na sentença, o artigo 333 do Código Penal Brasileiro diz respeito ao crime de corrupção ativa que tem como núcleo do tipo o verbo oferecer e na condição de ser a vantagem indevida e a funcionário público.
A denúncia foi incisiva na imputação a Andressa. Na instrução processual, a Justiça, “buscando arduamente apurar a verdade com escopo no princípio da verdade real”, seguiu fielmente a marcha processual.
Com todas as providências e cuidados que devem tomar a Justiça para que a sociedade tenha a proteção devida, verificou-se que o conjunto probatório foi suficiente para se admitir que a acusada é culpada dos ilícitos que lhe são imputados.
A acusada Andressa, ao ser interrogada, adotou uma linha de defesa de negativa de autoria, montando uma história que nem ela mesma é capaz de acreditar, ou seja, que foi abordada por policiais tendo consigo a importância de R$ 3.300,00. Neste momento, os policiais a orientaram a buscar alguém habilitado para levar sua moto e, por isso, fez contato com o menor para chamar alguém habilitado.
Em seu interrogatório, ela nega o tempo todo as ligações que recebeu, “o que é absurdo, pois tudo ocorreu na presença dos policiais”, ressalta a magistrada na sentença.
Os policiais que foram ouvidos na instrução afirmaram que a acusada foi abordada no momento em que caminhava na rua em companhia do menor e que, segundo testemunhas, eles haviam saído do bar nas proximidades.
O policial militar Carlos de Lecondat disse que a acusada informou que o dinheiro que se encontrava com ela fora dado por sua mãe para pagar umas contas e que os PMs podiam ficar com ele.
Com o adolescente, os policiais encontraram as pedras de crack apreendidas.
Já o policial Marcelo Marçal disse que durante a abordagem Andressa recebeu diversas ligações e nelas era perguntado se ela havia comprado a arma. O PM Marçal conversou com a mãe da acusada e por ela foi informado que a Andressa havia saído para conseguir entre R$ 200 e R$ 300 emprestados.
Assim, cai a informação de Andressa e da mãe dela que ela tinha pegado com algum agiota o dinheiro com ela apreendido.
O policial militar também disse que a acusada ofereceu o dinheiro que se encontrava com ela aos policiais no momento da abordagem.
A acusada em seu interrogatório disse que somente conhecia o menor de vista. No entanto, o menor disse que conhecia a acusada há cerca de três meses.
De acordo com a juíza Eliana Siviero, tanto o adolescente como Andressa deram explicações sem nenhum sentido quanto a ela o ter pedido para ele fazer ligações.
“É claro que é sem sentido, pois na verdade, este pedido não existiu. Se fosse verdade, a acusada não pediria a uma pessoa que somente conhece de vista para arranjar alguém habilitado para pilotar a moto dela. Ela mesma ligaria”, ressalta a magistrada na sentença.
No tocante ao crime de corrupção ativa, os próprios policiais afirmaram que a acusada lhes ofereceu o dinheiro que tinha e que poderiam ficar com ele.
“Ora, se o dinheiro era dela de forma legítima, não havia motivo para oferecê-lo aos policiais. Isso é prova de que ela estava envolvida com outros crimes. Por outro lado, mesmo que o menor, ouvido como informante do Ministério Público, tente inocentar a acusada, quando questionado por mim, acaba afirmando que as drogas que tinha consigo eram para traficar o que demonstra que ele já vivia neste tipo de vida”, prossegue a juíza Eliana Siviero.
Mais adiante a magistrada afirma que “a história inventada pela acusada se desmoronou diante das provas carreadas para os autos. Assim, verifico que a acusada mantinha uma associação com o menor para prática do crime de tráfico de drogas e o dinheiro com ela encontrado era oriundo da venda das drogas.”
Diante de tais provas, não há como prosperar a tese da defesa de absolvição. Nos crimes de tráfico, frisa a juíza, “situação em que a população tem receio de se manifestar, resta ao Estado contar com a colaboração dos policiais e confiar em suas declarações, posto que, normalmente, são as únicas testemunhas da acusação.”
Em relação ao crime do art. 333 do CP (corrupção ativa), a juíza Eliana Siviero sentenciou:
“Quanto à culpabilidade, considero-a em grau elevado. A acusada não possui antecedentes criminais. Conduta da acusada é boa. Personalidade de pessoa comum. Não ficou provado qualquer motivo para a conduta. As circunstâncias do crime são comuns à espécie, demonstrando, a acusada, determinação na ação delituosa. As conseqüências do delito são de todo nefastas, já que não atingiu o fim desejado.”
Andressa contratou um advogado que, por meio de apelação criminal, recorreu das condenações. O julgamento do recurso aconteceu na quarta-feira passada (20/03). A defesa solicitou a impugnação da sentença ou a redução das penas.
A relatora da apelação criminal, desembargadora Catharina Maria Novaes Barcellos, definiu em seu voto que ficou constada a prática de tráfico de drogas, “devido ao farto material apreendido”.
Concordou com a condenação por corrupção ativa, por entender que os policiais militares Carlos de Lecondat e Marcelo Marçal, que recusaram o suborno oferecido pela ré, “mantiveram a coerência em todos os depoimentos, enquanto a denunciada apresentou contradições em seus depoimentos” à Polícia Civil e à Justiça.
“Observa-se que a acusada queria escapar do flagrante e, para isso, pretendeu que os policiais se omitissem. Portanto, deve ser também mantida a condenação por corrupção ativa”, prosseguiu a desembargadora em seu voto.
Quanto à acusação pelo crime de associação ara o tráfico, Catharina Novaes Barcellos ponderou que restou dúvida. Por isso, decidiu pela absolvição da mulher, reformando, neste ponto, sentença de primeiro grau, que havia condenada a acusada a três anos e seis meses de reclusão.
Quanto ao pedido da defesa para redução das penas, a desembargadora fez uma nova dosimetria, concluindo que a condenação da acusada por tráfico de drogas deve ser reduzida de seis anos e seis meses para quatro anos de reclusão e manteve, na íntegra, a condenação de dois anos por corrupção.
Para as duas condenações, a desembargadora determinou o cumprimento da prisão inicial em regime semiaberto. Ao todo, a acusada pegou seis anos. O voto de Catharina Novas Barcellos foi seguido pelos desembargadores Ney Batista Coutinho e Manoel Alves Rabelo.