O secretário de Estado da Justiça, André Garcia, é mesmo um homem franco. Na sexta-feira (11/01) ele disse ter sido surpreendido pela denúncia de tortura na Penitenciária Estadual de Vila Velha II , no Complexo Prisional de Xuri. E, acima de tudo, lamentou o fato e determinou investigação imediata e ainda afastou o diretor adjunto da unidade prisional.
As cenas de selvageria aconteceram no dia 2 deste mês. Vieram à tona oito dias depois, quando a Comissão de Prevenção e Enfrentamento à Tortura do Tribunal de Justiça recebeu denúncia anônima e mandou uma equipe ao local, que constatou: 52 apenados com marcas de ferimentos graves, principalmente nas nádegas, por terem sido obrigados a sentar nus num chão de cimento por mais de duas horas, em plena luz do sol.
O secretário poderia ter evitado a surpresa – não as torturas, porque ninguém consegue dominar feras armadas– caso não tivesse mexido na até então eficiente Diretoria de Inteligência da Sejus, que, por mais de uma década, segurou “a onda” nos presídios, antecipando crises e evitando, sobretudo, rebeliões e mortes de presos.
Ao assumir a Sejus em setembro de 2012, no lugar de Ângelo Roncalli – que saiu após ser indiciado pela Polícia Civil e denunciado pelo Ministério Público Estadual por desvio de recursos numa autarquia da Pasta –, André Garcia decidiu afastar dos cargos justamente os profissionais que ajudaram nas investigações que descobriram corrupção no Iases e que mantinham sob controle a ordem e disciplina nos presídios: o diretor de Inteligência da Pasta, tenente-coronel Douglas Caus; o diretor de Inspeção e Controle das Unidades Prisionais, Rodrigo Bernardo Ribeiro Pinto; e o diretor de Segurança Prisional, Evaldo Amâncio.
Conforme este Blog havia informado em 19 de setembro último, a exoneração do tenente-coronel Caus e dos diretores Rodrigo e Evaldo causou surpresa no meio, porque eles faziam parte de um grupo que vinha contribuindo para a manutenção da ordem nos presídios.
Graças ao trabalho da Inteligência da Sejus, o Espírito Santo reduziu o número de mortes nas cadeias, acabou com rebeliões e diminuiu drasticamente as fugas.
O tenente-coronel Caus, por exemplo, tinha conhecimento sobre a vida pregressa de cada preso que entrava no sistema. Sabia onde cada preso deveria ser abrigado, para evitar guerras de gangues dentro das unidades. Caus é, acima de tudo, um servidor de Estado; não de governo.
Sabia e antecipava atritos entre encarcerados, agentes penitenciários e direção das unidades. O oficial mantinha em cada unidade prisional do Espírito Santo uma célula da Inteligência, que o avisava sobre qualquer movimentação estranha na cadeia, inclusive quando ocorriam irregularidades – como tortura – cometidas por funcionários das unidades.
A Inteligência da Sejus fazia para o então secretário Roncalli um relatório diário do que ocorria em cada unidade prisional.
Causa surpresa, portanto, o fato de terem se passados oito dias das cenas de tortura na PEVV II sem que nenhum funcionário da Sejus – seja o pessoal do Alto Escalão, como subsecretários, diretores, coordenadores, supervisores, psicólogos, assistentes sociais, assessores de imprensa, passando pelos próprios agentes – batesse à porta de seu secretário e avisasse sobre o ocorrido.
Se a estrutura de Inteligência da Secretaria de Justiça não tivesse sofrido um revés, com certeza o secretário André Garcia não teria sido surpreendido com mais uma cena de selvageria e truculência no sistema prisional capixaba.