Ao assumir a presidência do Tribunal de Justiça do Espírito Santo, o desembargador Pedro Valls Feu Rosa assinou 15 convênios com o governo do Estado, Ministério Público e Polícias Federal e Rodoviária Federal que têm a finalidade principal de prevenir a criminalidade e combater a impunidade e à corrupção no Estado.
Emocionado, Pedro Feu Rosa fez um discurso que levou às lágrimas dezenas de pessoas que lotaram o Salão Pleno do Tribunal de Justiça. Ele próprio falou durante todo o tempo com a voz embargada e as mãos trêmulas. Porém, recusou copo de água, indo até ao fim com sua fala. Em sua fala, pediu desculpas à população capixaba pelas torturas nas cadeias, assassinatos sem punição e os crimes de corrupção que persistem nos órgãos públicos. Ao final do discurso, Pedro Feu Rosa leu a oração de São Francisco de Assis.
O novo presidente do Tribunal de Justiça ganhou um forte aliado em sua luta de modernizar o Judiciário capixaba: os próprios juízes, que, reunidos no dia anterior, decidiram em assembleia que vão suspender suas férias para que possam dar agilidade à tramitação de processos.
Um dos convênios, assinado com o governador Renato Casagrande – presente à solenidade –, Ministério Público e Polícias Federal e Rodoviária Federal, tem a finalidade de fortalecer a articulação institucional entre os órgãos responsáveis pela segurança pública, objetivando o planejamento estratégico, e a implementação de ações conjuntas de controle da violência criminalizada e do combate a todo e qualquer tipo de crime fiscal, visando otimizar a parceria entre as Varas de Justiça Criminal e demais órgãos de segurança pública.
O novo presidente, Pedro Feu Rosa, apresentou novidades que irá implantar.
“Serão instalados painéis em frente ao Tribunal de Justiça com informações sobre processos. Os painéis irão mostrar quem é o magistrado responsável pelo caso e há quanto tempo o processo está tramitando. Em caso de atraso na solução do processo, uma luz vermelha será acesa para alertar a população. Um dos painéis irá mostrar todos os processos que envolvem improbidade administrativa. A família capixaba não vai mais esperar décadas para ver justiça”.
Aos 45 anos de idade, o desembargador Pedro Valls Feu Rosa é o mais jovem presidente de um Tribunal de Justiça no Brasil. Ele assume a presidência do TJES para o biênio 2012/2013. Entra no lugar do desembargador Manoel Alves Rabelo, que comandou o TJES nos últimos dois anos.
Os desembargadores Carlos Roberto Mignone e Carlos Henrique Rios do Amaral assumiram, respectivamente, os cargos de vice-presidente do TJES e corregedor-geral da Justiça, que no biênio 2010/2011 eram ocupados pelos desembargadores Arnaldo Santos Souza e Sérgio Luiz Teixeira Gama.
O desembargador Manoel Alves Rabelo comentou sobre os dois anos em que comandou o TJES. “Durante o meu biênio, houve uma dedicação extraordinária de magistrados e servidores. Obtivemos expressivos resultados com nossas boas práticas. Realizamos, por exemplo, diversos mutirões de conciliação. Também realizamos um concurso público para servidores e demos início ao concurso de juízes. Agradeço aos desembargadores Arnaldo Santos Souza e Sérgio Luiz Teixeira Gama pelo apoio e colaboração. Eles foram decisivos para uma gestão harmoniosa e com bons resultados”.
E desejou sucesso ao novo presidente. “O desembargador Pedro Valls Feu Rosa apresenta várias qualidades como, por exemplo, inteligência, dinamismo e preocupação com o social e com a probidade administrativa. Desejo a ele muito sucesso, paz e tranquilidade. Os desembargadores Carlos Roberto Mignone e Carlos Henrique Rios do Amaral também apresentam muita competência, equilíbrio e capacidade de bom relacionamento com os colegas”.
Já o desembargador Samuel Meira Brasil Júnior, escolhido para saudar o novo presidente, fez sua explanação: “Quando fui convidado para proferir um discurso sobre o desembargador Pedro, comecei a pensar no que poderia dizer. Se eu enaltecesse toda a sua capacidade intelectual e sua jovialidade, eu diria o óbvio. Então, desejo à sua excelência sabedoria, determinação e serenidade para solucionar os processos com justiça, fazer o que é preciso e garantir uma justiça firme. Tenho certeza de que teremos uma administração exemplar e confio que será um marco para o Judiciário”.
O presidente da OAB/ES, Homero Mafra, afirmou que a posse do desembargador Pedro como presidente representa um tempo de esperança. “Uma posse é sempre cercada de expectativas. Esta posse está cercada de expectativas e também de esperança”, disse Mafra, que entregou ao novo presidente uma série de reivindicações feitas por advogados de todo o Estado, que visam, sobretudo, melhorar a infraestrutura dos fóruns.
Já o governador Renato Casagrande elogiou o trabalho da antiga Presidência e depositou um voto de confiança no novo presidente. “O desembargador Manoel Rabelo foi um pacificador. Durante os seus dois anos como presidente, ele purificou o Judiciário capixaba. O Tribunal de Justiça se renovou e avançou. Tenho certeza e expectativa de que o desembargador Pedro Valls Feu Rosa, com sua capacidade intelectual e visão da sociedade integrada ao Poder Judiciário, fará uma boa administração”.
O DISCURSO DE POSSE DE PEDRO FEU ROSA E SUAS PRIMEIRAS AÇÕES COMO PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
“Dizem chamar-se ‘gratidão’ a memória do coração. Assim, ser humano que sou, peço licença para começar minhas palavras externando um agradecimento pessoal a todos quantos suavizaram minha caminhada até esta data.
Dirijo meu primeiro e maior sentimento ao Criador, pela paciência e compreensão – apesar de minhas falhas e fraquezas humanas, nunca me faltou a demonstração inequívoca de Sua bondade. Muito obrigado, meu Deus!
Ao meu saudoso pai, de quem guardo com carinho a lição maior de jamais esmorecer na defesa dos mais fracos, tantas vezes preconceituosa e injustamente chamados de “zé-povinho”.
À minha mãe, Valéria, pelo desprendimento e grandeza de espírito com que educou aquela criança travessa e curiosa, cuja maior alegria era quebrar os presentes que recebia para saber como funcionavam!
Espero, meus pais, estar sendo digno de todos os sacrifícios que fizeram por mim.
A Luciana, minha esposa, a cuja vida as atribulações de minha profissão tanto amargor trouxeram – mas que nunca deixou de estar ao meu lado, cumprindo com honra e sentimento aquela promessa feita há exatos 20 anos diante de um altar.
Lanço também um olhar aos meus Colegas deste Tribunal de Justiça – e já são bons 17 anos de caminhada! Sou e serei reconhecido por jamais me ter faltado aquele apoio indispensável à manutenção do entusiasmo, sincero e juvenil, que nutro por esta instituição – apoio este que tenho procurado honrar com o melhor de minhas forças.
Agradeço, finalmente, a todos aqueles que em mim depositaram um voto de confiança, aos que me estenderam a mão nos momentos difíceis, aos muitos que comigo compartilharam e compartilham o sonho de um mundo melhor. A todos vocês, a cada um de vocês, o meu sincero e profundo ‘muito obrigado’. Retribuirei tentando não decepcioná-los.
Mas já me alongo, e recordo ser este um momento institucional. Assim, a partir deste momento, falará não mais o Pedro, mas o presidente do Poder Judiciário do Estado do Espírito Santo, a praticar o seu primeiro ato oficial – e seja ele o de pedir desculpas.
Eu peço desculpas aos que, com fome e sede de justiça, nós não saciamos e não temos saciado. Curvo-me, neste momento, diante da memória daqueles que tombaram vítimas do crime organizado, deixando para os entes queridos a herança amarga daquela humilhação que a impunidade traz.
São irmãos, esposas, filhos e pais que amargaram e amargam 20, 25, 30 anos de espera não por uma condenação, mas por uma resposta. Uma simples resposta que seja. Um sim ou um não.
Questionados, costumamos colocar a culpa nas leis ou nos advogados. Isto não é verdade. Não há Código de Processo, não há defesa neste mundo que possa atrasar um julgamento por décadas a fio! Não, aqui a culpa é nossa. Nossa culpa, nossa tão grande culpa.
Muitas vezes leões diante dos carneiros que enchem ainda mais nossas já abarrotadas prisões, aqui temos, sim, enquanto instituição, cometido o pecado de ser carneiro diante dos leões. E por este pecado eu peço desculpas.
Mas desculpas não bastam. Cumpre venham acompanhadas de atos. É quando anuncio que, juntamente com o Poder Executivo e o Ministério Público, localizaremos e agilizaremos cada processo decorrente de pistolagem e de crime organizado que esteja tramitando. Cada um deles. Colocaremos seus dados em um painel que será instalado na entrada deste Tribunal de Justiça, replicado na Internet. Nele constará o nome do magistrado responsável, o número de dias no gabinete e há quanto tempo começou a tramitação no Judiciário. Em caso de atraso, uma luz vermelha alertará a população.
Com este sistema, tão simples quanto barato, confiamos em que nunca mais, mas nunca mais mesmo, a família capixaba será manchada pelo descaso dos processos que se arrastam por décadas a fio, esquecidos ou relegados a um segundo plano. Esta impunidade vergonhosa começa a acabar aqui. Agora. Nesta sala. Neste momento.
Eu peço desculpas aos torturados. Desculpas aos que foram devolvidos às ruas sem uma perna, sem as duas, paraplégicos, aleijados – e, o pior de tudo, sem brilho nos olhos. Vivos estão, mas morreram para a vida. Será que já foram indenizados? Ou perambulam por aí, passando fome? A todos eles eu peço desculpas em nome do Poder Judiciário do Estado do Espírito Santo.
Aqui, bom é que se diga, a culpa não é só nossa. Afinal, como dizia Friedenberg, “as pessoas não só aceitam a violência quando perpetrada pela autoridade legítima, como aceitam legítima a violência contra certas espécies de pessoas, não importa quem a cometa”.
Sim, esta é uma culpa de muitos. Mas temos, cá, a nossa parcela de responsabilidade. E por ela eu peço perdão.
Peço desculpas, sinceras e doídas desculpas, às mães de presos que receberam seus filhos de volta esquartejados, embalados em caixotes, vítimas de chacinas impunes praticadas sob os olhos do Estado.
Quanto horror, meu Deus! Quanto horror! E sim, eu sei: ninguém aqui é mau. Mas quanto mal foi feito! Quanta crueldade impune!
Uma vez mais, a culpa não nos é exclusiva. Mas, também uma vez mais, cá temos nossa parcela de responsabilidade. Faltou, aqui ou ali, aquele tom de voz um decibel mais alto. Deixamos, lá ou acolá, de tomar aquela medida mais dura que a realidade impunha.
Foi aí, neste detalhe, que erramos enquanto instituição – poderíamos ter ido além, ter sido mais veementes e enérgicos. Sim, nós erramos. Eu errei. Eu errei. E eu peço desculpas, meu Deus.
Que venha este sentimento acompanhado de atos. Será assim que instituiremos, daqui a alguns instantes, a Comissão Estadual de Prevenção e Enfrentamento à Tortura. Na boa companhia do Poder Executivo, do Ministério Público, da Ordem dos Advogados do Brasil, da UFES, da Defensoria Pública, do Conselho de Direitos Humanos e do Movimento Nacional de Direitos Humanos, levantaremos cada caso de tortura e chacina praticado em nosso sistema prisional. Cada um deles. E que não fique um sequer para trás. Estes processos serão lançados em um segundo painel, também a ser instalado na entrada deste Tribunal de Justiça.
Nele, ler-se-á o nome do acusado e do magistrado responsável, o número de dias que com ele está o processo, e há quanto tempo este tramita. Também aqui, em caso de atraso, uma sinalização vermelha servirá de alerta.
Lançaremos ainda, em parceria com o Conselho Estadual dos Direitos Humanos, o Portal dos Direitos Humanos, que permitirá a qualquer do povo acompanhar em que tem dado cada violação cometida neste estado.
A página da tortura escancarada e impune, bom é que se diga, já começou a ser virada pelo Poder Executivo e por este Tribunal de Justiça. Mas falta consolidar este avanço e acertar as contas com o passado, para através dele prevenirmos novos horrores no futuro.
Que não tenha sido derramado em vão, aos nossos pés, o sangue de tantos semelhantes e as lágrimas de tantas mães. Que sirva este sacrifício para que nunca mais, mas que nunca mais mesmo, a tortura seja praticada impunemente em um estado que tem orgulho de se chamar Espírito Santo!
Eu peço desculpas, e desculpas muito especiais, aos pobres e miseráveis. Às crianças que morrem pelas favelas, devoradas por ratos ou vítimas da falta de um simples esgoto. Aos semelhantes nossos que reviram latas de lixo buscando alimento sobre o solo de um país tão rico!
A eles eu peço desculpas, humildes e sentidas, porque não temos dado a devida prioridade a todos os processos que envolvem uma corrupção e improbidade assassinas, porque praticadas às custas do sangue de tantos inocentes.
Eu peço desculpas aos empresários que perderam suas empresas e aos chefes de família que perderam seus empregos, vítimas infelizes de tantos corruptos que ainda não encontraram punição.
É certo, e fique isto muito claro, que a culpa por este descalabro não é exclusiva do Poder Judiciário. Ela começa em um mundo jurídico pródigo em conceder direitos que afrontam as mais básicas noções de Justiça. Ela continua pelas favelas e bairros nobres, pelos barracos e salões refinados, onde em certos momentos chega-se a ter a impressão de que “quanto mais bandido, mais aplaudido”. E acaba aqui, materializada em decisões muitas vezes tímidas ou injustificadamente tardias.
Assim, pela parte que nos cabe, eu peço desculpas. E daquelas acompanhadas de atos. É quando anuncio um Termo de Cooperação com o Tribunal de Contas, visando a troca de informações e agilização de procedimentos de combate à bandalha. Mas iremos além: de mãos dadas com o Ministério Público, buscaremos localizar e agilizar cada ação de improbidade e cada processo sobre corrupção. De cada um deles prestaremos contas ao povo deste estado, através de mais dois paineis instalados na entrada deste prédio, e replicados na Internet.
O primeiro deles, relativo às ações de improbidade, está sendo acionado neste momento, enquanto pronuncio estas palavras. E o segundo, sobre os processos por corrupção, dentro em breve será instalado. Estará lá, aos olhos do povo, cada caso, seguido do nome do magistrado responsável, há quantos dias com ele está, e um alerta vermelho em caso de atraso.
Quem for inocente, que seja absolvido. Quem for culpado, que seja condenado. O que não se aceita mais é que fique o nosso povo a exclamar, com Castro Alves, “Justiça, ó Justiça, onde estás que não respondes? Em que mundo, em que estrela tu te escondes”?
Eu peço desculpas aos nossos semelhantes que ficaram esquecidos pelas prisões afora, sem processo ou julgamento. Eles não foram poucos, e por lá não ficaram pouco tempo. Pessoalmente encontrei um trancafiado há seis anos, e o Conselho Nacional de Justiça localizou outro há onze. Será que eles já foram indenizados? Ou vagam por aí passando fome?
Isto não pode ser. Isto é desumano. Isto nos degrada. Mas isto começa a acabar aqui e agora, nesta sala e neste momento. Lado a lado com o Poder Executivo, o Ministério Público, a Ordem dos Advogados do Brasil, a UFES, a Defensoria Pública e o Conselho de Direitos Humanos, criaremos daqui a poucos minutos um Grupo de Trabalho Interinstitucional para enfrentar o grave problema penitenciário.
E anuncio, desde já, o primeiro resultado desta união de esforços: um outro painel, que já está sendo desenvolvido em parceria com o Poder Executivo, e que será também afixado na entrada desta Casa. A partir de sua implantação cada preso provisório será listado. Seguir-se-á o nome do magistrado responsável, há quantos dias a prisão provisória perdura, e um alerta vermelho em caso de prolongamento desta situação. O protótipo desta ferramenta acaba de ser ligado neste momento. Já está lá, na porta deste Tribunal de Justiça, para garantir que nunca mais um semelhante nosso seja esquecido pelas prisões afora.
Todas estas medidas que aqui anunciei, e devo ser sincero, não resolverão o problema da morosidade. O fato é que nossos juízes e servidores ainda são poucos, mal distribuídos e muitas vezes carentes de estrutura. Mas é exatamente diante desta realidade confusa que entendemos importante destacar existirem “processos” e “processos”, lançando um foco de luz naqueles casos mais graves, que demandam nossa maior atenção.
Este destaque é fundamental quando vivemos em plena era da estatística, na qual o importante é julgar muito, não importa o que. Inacreditavelmente, nesta realidade um processo decorrente da chacina de inocentes vale o mesmo que um outro tratando do furto de galinhas. O que importa é o número de sentenças. Premia-se quem produz muito, e não quem produz bem. E assim desvirtua-se a finalidade de uma instituição tão bela e importante como o Poder Judiciário.
Buscamos, aqui, simplesmente lembrar que o povo precisa, e desesperadamente, de solução pronta e enérgica pelo menos nos casos mais graves. E sobre estes nós temos, sim, condições de dar uma resposta. E nós queremos dá-la. E nós iremos dá-la.
Nos últimos dias tenho recebido a mão estendida de muita gente. Gente boa, gente séria, gente que me procura oferecendo ajuda para simplesmente mudar uma instituição, sem nada querer em troca.
Eu quero dar, diante da população do meu estado, dois testemunhos. O primeiro vem das centenas de servidores que vieram a este Tribunal de Justiça simplesmente para oferecer ideias e força de trabalho.
O segundo veio dos juízes. Reunidos em assembleia, foram um a um abrindo mão de férias já deferidas e se colocando à disposição para assumirem maiores responsabilidades, conscientes do momento grave que atravessamos.
Da Associação dos Escrivães à dos Oficiais de Justiça, do Sindicato dos Servidores à Associação dos Magistrados, a mensagem tem sido uma só: queremos um novo Judiciário, e queremos ajudar.
Eles estão aí. Querem trabalhar. Querem de volta o orgulho de simplesmente dizer, olhando de frente o nosso povo, que pertencem ao Poder Judiciário do Estado do Espírito Santo.
Feridos por generalizações injustas, atingidos pelo corporativismo cego de alguns poucos, eles só querem aquela realização que qualquer profissional, de qualquer carreira que seja, busca. Só isso, e nada mais do que isso.
Sociedade capixaba, não podemos perder este momento único de coesão e vontade. Vejo diante de nós a chance de uma nova instituição, e mesmo de um novo Espírito Santo.
É por isso que peço, para esta imensa maioria silenciosa de pessoas de bem, um passo de fé.
Queremos, enquanto instituição, reconquistar o carinho das ruas. Queremos dobrar uma página. Queremos avançar, e de mãos dadas com o povo. Queremos, aqui e agora, começar algo novo, rumo a um futuro de maior transparência e eficiência.
Que iniciemos esta caminhada sobre as bases da sinceridade: sim, nós erramos. Sim, nós temos falhado. Sim, nós estamos em falta com os pobres e os miseráveis. Sim, em muitos momentos nos preocupamos mais com os nossos direitos que com os nossos deveres. Por estas falhas, pelas omissões, pelas decepções que tenhamos causado, nós pedimos desculpas.
O nome é tabu, mas há que ser dito e enfrentado: sim, o Tribunal de Justiça pede desculpas ao povo deste Estado pela Operação Naufrágio. Pedimos desculpas. Talvez culpa de alguns, talvez culpa de muitos, ela nos manchou a todos. Condenou uma instituição. Desonrou todo um Estado.
Temos nos esforçado, é verdade, para recuperar o tempo perdido. E nosso Tribunal de Justiça, renovado e unido, tem dados mostras sérias e veementes disso – mas precisamos de apoio e força para avançarmos ainda mais. Grandes trabalhos nos aguardam. Temos pela frente o desafio do combate à impunidade. A luta pela modernização de uma estrutura esclerosada. A peleja pela mudança de toda uma cultura burocrática e insensível. E eu peço à população, neste momento, em nome de todos os juízes e servidores que represento, um voto de confiança e uma mão amiga para esta empreitada. Que o passado nos sirva de lição, e que com ele façamos as pazes e acertemos nossas contas, mas que doravante comecemos a marchar rumo ao futuro.
Aqui estamos, com as mãos estendidas, a pedir um apoio decisivo ao Ministério Público. Ao Poder Executivo. Ao Poder Legislativo. À nossa Bancada Federal. À Ordem dos Advogados do Brasil. Ao Conselho Nacional de Justiça. À Imprensa. Aos Municípios. Aos movimentos sociais. A todo o povo capixaba, enfim.
Há tanto por ser fazer! E tão pouco tempo!
Começo pelas vítimas de pedofilia, pelas crianças cuja inocência a maldade humana aniquilou, em crimes muitas vezes impunes. É hora de o nosso estado, destacado por ter chamado a atenção de todo o Brasil sobre este tema, nele avançar como deveria! Assim, na boa companhia do Ministério Público, levantaremos cada caso, e dele prestaremos contas ao povo da forma mais transparente possível, em mais um painel como os que aqui já descrevi.
Temos que lançar um olhar aos professores porque não temos ouvido os seus lamentos. Não temos acordado para a realidade das salas de aula que se transformaram em domínios do crime, dos colégios invadidos pelo mal.
É chegada a hora de reparar esta falta. E assim pactuaremos, em mais alguns instantes, com o Poder Executivo e o Ministério Público, ações concretas de apoio aos educadores. Haverá idas periódicas às escolas, previstas em um calendário fixo – e destas visitas e dos problemas nelas encontrados prestaremos contas ao povo, da forma transparente que aqui tenho exposto.
Que os mestres encontrem em juízes e promotores de justiça uma mão amiga, eis o que buscaremos.
E que dizer da segurança pública em geral? De um lado os órgãos de segurança pedindo maior apoio e reclamando das sucessivas solturas de bandidos – e a crítica procede, pois já encontrei um deles com nada menos que 19 Alvarás de Soltura. Do outro lado, não é raro que nossos juízes se deparem com ações mais “pirotécnicas” do que técnicas – e sobre seus ombros recairá a tarefa ingrata de assumir o ônus da impunidade perante a opinião pública.
Isto tem que acabar. Afinal, estamos todos do mesmo lado. Que nos sentemos todos ao redor de uma mesa, e daquelas redondas, que não tem nem “lado de cá” nem “lado de lá”.
Esta mesa, começaremos a construi-la logo mais, com a assinatura de um Protocolo de Intenções que criará uma agenda comum para os órgãos responsáveis pela segurança pública. Esperamos que seja este o início de uma nova era no combate ao crime em nosso estado.
Que não nos esqueçamos dos menores e das mulheres vítimas de violência – eles praticamente só tem apoio razoavelmente digno e completo na capital. No restante do estado, simplesmente não existe uma estrutura capaz de atendê-los, eis a verdade!
Isto é grave. Quanto aos menores, é triste a cena dos “capiaus” entregues ao convívio muitas vezes violento da cidade grande – acabam seviciados ou mortos. E às mulheres quase sempre resta apenas o silêncio submisso e a lágrima abafada.
O Poder Judiciário, sozinho, não tem como enfrentar este problema. Daí anunciar a criação de uma verdadeira “frente” para combatê-lo. Esperamos, a muitas mãos, começar a mudar esta realidade em cada município capixaba. Os recursos virão da nossa Bancada Federal, que pela primeira vez vem andar, unida, com este Tribunal de Justiça, e do Poder Executivo. A Associação dos Municípios e a Assembleia Legislativa, em parceria com os prefeitos, providenciarão o apoio logístico indispensável. E complementarão o movimento a Defensoria Pública e o Ministério Público, fazendo uso da estrutura criada.
Esta ação, inédita em nosso estado, começará daqui a mais alguns instantes. Levará tempo, é certo, até que consigamos mudar a realidade de todo um estado. Mas toda obra tem que ter um início, uma pedra fundamental. Será o que faremos logo mais, na esperança de que já no ano que vem começaremos a retirar menores das garras da morte e mulheres das trevas da humilhação.
Temos também que combater a sonegação de impostos, que torna injusta toda uma sociedade. As dificuldades são muitas. Começam com a falta de transparência no processamento das autuações e terminam com a falta de tecnologia e até de foco do Poder Judiciário – basta dizer que apenas 4% das Execuções Fiscais respondem por 96% dos débitos em cobrança, sem que haja um sentido de priorização.
Mas também esta realidade começa a acabar, aqui e agora. De mãos dadas com o Poder Executivo, começaremos algo novo. Desde a propositura das execuções até a priorização nos julgamentos, passando pelos valores envolvidos, tudo será acompanhado eletronicamente, e disponibilizado aos olhos da população.
O primeiro passo já foi dado. Acaba de ser acionado, neste momento, o Painel das Execuções Fiscais, que ainda será refinado e ampliado. Mas já estão lá, aos olhos do público, os dados dos maiores processos, com quem estão e há quantos dias.
Há que se pensar também no desenvolvimento econômico. Só se gera progresso, só se cria riqueza e só se elimina a miséria onde existem regras claras e de aplicação certa, onde existe estabilidade jurídica.
E esta estabilidade jurídica é incompatível com a morosidade, com a não-decisão, com a falta de compreensão sobre o exato impacto dos julgamentos.
É preciso, assim, que estudemos mecanismos que proporcionem os instrumentos jurídicos necessários ao desenvolvimento sustentável deste estado. Eles começam pela redução dos entraves burocráticos, passam por uma estrutura judiciária mais preparada para lidar com as exigências de um mundo globalizado comercialmente e terminam na atração dos investimentos que esta nova realidade tornará possíveis.
Também nesta área estamos dando, aqui e agora, um primeiro passo. Juntamente com o Poder Executivo, a Bancada Federal e o Forum de Entidades e Federações, daremos início ao “Plano de Desenvolvimento Legal” – que através dele, dentro em breve, possamos tornar todo este estado mais competitivo, interiorizando a geração de riquezas e atraindo mais investimentos para uma economia que já não pode mais se limitar às grandes cidades!
Todas estas ações exigirão, de nós, uma estrutura mais leve e eficiente. Esta será uma outra luta a ser enfrentada. Nosso modelo de funcionamento é medieval, baseado em rígidos compartimentos que dificultam a mobilidade e a justa distribuição da carga de trabalho.
Nós temos, hoje, a maior relação juiz/habitante do país, parte de um quadro de recursos humanos cujo peso já começa a se fazer sentir nas contas públicas – e no entanto não temos juízes para o interior do estado.
Hoje, convivemos com magistrados e servidores que lidam com milhares de processos a poucos metros de outros que os tem apenas em centenas. Isto é injusto, e isto não é inteligente.
E que dizermos do inferno da burocracia, que – e cito um pequeno exemplo – impõe muitas vezes a um juiz que responde por duas varas ou comarcas o ato ridículo de escrever cartas para si próprio e ainda respondê-las, prometendo ao final sempre estar à disposição de si próprio quando dele ele mesmo precisar?
Sim, há que se dizer a verdade: nosso sistema de funcionamento é atrasado. Premia a ineficiência. Oculta a verdade. E, o pior, penaliza a população.
A saída não é mais da mesma coisa. Há que se partir para o novo. Há que se repensar nossa estrutura sob um enfoque técnico e gerencial.
Será dentro deste espírito que formalizaremos, logo mais, um Termo de Cooperação com o “Espírito Santo em Ação” e com o Sindijudiciário criando um grupo de estudos encarregado de buscar soluções para cada um destes problemas.
Este grupo não agirá com base nos “achismos” ou sob a inspiração dos interesses corporativos. Não. Tentaremos algo diferente. Ele terá à disposição uma assessoria técnica, especializada em gestão. Buscaremos, de forma lógica e profissional, identificar e eliminar os gargalos da burocracia e da injusta divisão da carga de trabalho.
Confio em que deste grupo sairá a proposta de uma instituição mais leve, menos custosa e muito mais eficiente.
Precisaremos também resolver o problema do Forum de Vitória. Dia desses soube do drama do advogado que faleceu por conta do atraso de atendimento médico, lá pelo sétimo ou oitavo andar daquele prédio. Morreu, aquele semelhante nosso, porque simplesmente não conseguiram levá-lo em menos de 20 minutos até o hospital – que fica do outro lado da rua!
Sim, já está provado que estruturas verticais não dão conta do alto tráfego de um Forum de capital de estado. A quem ainda duvidar, que veja as longas e tristes filas formadas cotidianamente em frente aos elevadores. Partes, advogados, juízes e servidores, todos sofrendo juntos!
E o pior é que Vitória tem hoje não um, mas quinze Foruns. São quinze prédios espalhados pela cidade, quase todos sem vagas de estacionamento, causando ao povo deste estado um prejuízo difícil de quantificar. Nós temos que acabar com isso.
Daí a ideia de construirmos em São Pedro a “Vila da Justiça”. Que nossa população possa encontrar, em um lugar só, todos os serviços que a cidadania pede, sendo atendida com dignidade em um local amplo e confortável.
O melhor: a maior distância que nos separa daquele local não é física, é social – e começaremos a reduzi-la. A contar da Reta da Penha, a distância física é de apenas 6 km, talvez a extensão da Praia de Camburi, mas pensemos na redução de distância social aí implicada – principalmente quando já anunciadas pela Prefeitura Municipal as grandes obras de infraestrutura.
Este não é um projeto pequeno, e não é para agora. Mas é agora que o iniciamos, de mãos dadas com o Poder Executivo. Meu mandato, daqui a dois anos terá se encerrado. Logo em seguida, o do Governador Renato Casagrande. Sim, as coisas da vida passam, e passam muito depressa. Mas que deixemos para as gerações seguintes uma cidadania fortalecida em um cantinho hoje tão carente de Vitória.
Nossa derradeira ação inicial, e deixei-a por último para que restasse bem marcada em nossas memórias, será com a Ordem dos Advogados do Brasil. Já passou da hora de ampliarmos nossos canais de diálogo.
Coisa triste, a cena de advogados ao lado de clientes folheando processos de pé, com a barriga encostada em algum estreito balcão, no meio dos corredores dos nossos prédios. Coisa triste, a administração do Judiciário prejudicada porque não foram entendidas pelos advogados peculiaridades mínimas do nosso funcionamento.
Coisa triste, a dos advogados que não entendem a cobrança de toda uma sociedade sobre os ombros dos juízes, que por sua vez não meditam sobre a necessidade de que aqueles deem uma satisfação aos seus clientes.
E que dizer das tristemente usuais representações, cada vez mais rotineiras e em tons cada vez mais elevados, de parte a parte?
Por conta de coisas assim aquele que deveria ser um local solene, de respeito e acatamento – o que elevaria juízes e advogados -, transforma-se a cada dia mais em território do bate-boca e da falta de cerimônia – e isto deprecia juízes e advogados perante uma população a cada dia mais descrente!
Tentaremos, juntos, mudar esta realidade – e começaremos formalizando não um instrumento, mas uma aliança; não um simples acordo, mas o externar da vontade sincera de devolver a servidores, juízes e advogados aquela majestade serena que nunca deveria ter deixado de existir em todos os recantos.
Estas são as nossas metas iniciais. Esta a peregrinação que hoje começamos. Nós somos um grupo de pessoas, de dentro e de fora desta instituição, dispostas a caminhar de mãos dadas, levando na bagagem o ideal de um Poder Judiciário melhor.
Nós não resolveremos todos os problemas, e nem nos pretendemos salvadores de coisa alguma. Mas nós faremos a nossa pequena parte.
Nossa caminhada não será fácil, sabemos disso. E assim porque conhecemos, e bem, os obstáculos que encontraremos pela estrada.
O primeiro deles será o corporativismo mesquinho, cego e pequeno de alguns poucos. A estes pedimos, desde logo: tenham pena desta instituição, à qual tanto mal já fizeram. Por favor, lembrem-se de que quem perde o valor perde tudo. Olhem para trás, vejam o que já perdemos, ouçam a voz das ruas, compreendam que o mundo mudou e reflitam sobre o futuro.
Nós encontraremos também aqueles que vivem da discórdia e da crítica fácil, aqueles que perderão discurso e seguidores caso as coisas melhorem. A estes pedimos que tenham, ao menos uma vez na vida, o sentimento simples da grandeza. Por favor, olhem para as ruas que seus próprios filhos frequentam e percebam a seriedade do momento histórico. Se não quiserem ajudar, que não atrapalhem.
Haverá pelo caminho, ainda, os maus. Impotentes diante das ideias e dos ideais, investirão contra quem os defende. São armas destes infelizes a calúnia e a intriga, se de coisa pior não puderem lançar mão. Já os vimos em ação aqui neste estado, da forma insidiosa típica dos discípulos do mal. A estes, desde já avisamos que poderemos até quebrar, mas não vergaremos. Começamos, aqui e agora, no Salão Pleno deste Tribunal de Justiça, uma luta sem quartel contra a impunidade e pela transparência – e nela não recuaremos. Nem um milímetro.
Alguns outros, ao longo da estrada, movidos por seja lá qual sentimento for, nos dirão ingênuos. Pode ser. Vá lá que seja. Nós somos ingênuos, sim. Mas talvez seja ingenuidade maior acreditar que caixão tem gaveta, ou que algum dia não prestaremos contas de cada ato nosso.
Finalmente, talvez apareça até quem diga ser loucura tentar consertar algo. E também aqui aceitamos a injúria!
Se é normal esta morosidade absurda que semeia a impunidade e leva ao peito de todo um povo a amargura do desamparo, então somos loucos, sim.
Se é normal o apego a estruturas administrativas engessadas, de custo inversamente proporcional à eficiência, então preferimos, sim, a loucura.
Se é normal colocar acima da Justiça o Direito e acima da verdade as formalidades, então que nos acolha algum nosocômio.
Se é normal que juízes escrevam cartas para si próprios, retrato maior de uma burocracia ridícula, então preferimos alegremente o ambiente de algum hospício.
Se tudo isto é normal, então, sim, nós somos loucos. Contemplando a realidade que as pessoas normais criaram, preferimos, e sem vacilações, a doce loucura de achar que este pode ser um mundo melhor.
E será assim, embalados por este sonho bom, que iremos pela estrada afora pedindo ao Criador, com São Francisco de Assis, que nos faça instrumento de Sua paz.
Onde houver ódio, que nós levemos o amor,
Onde houver ofensa, que nós levemos o perdão,
Onde houver discórdia, que nós levemos a união,
Onde houver dúvidas, que nós levemos a fé,
Onde houver erro, que nós levemos a verdade,
Onde houver desespero, que nós levemos a esperança,
Onde houver tristeza, que nós levemos a alegria,
Onde houver trevas, que nós levemos a luz.
Ó Mestre, fazei com que cada um de nós procure mais
Consolar que ser consolado,
Compreender que ser compreendido,
Amar que ser amado.
Pois é distribuindo a serena Justiça que se recebe a Sua misericórdia,
É perdoando as incompreensões que se é perdoado,
E é vivendo com grandeza que se nasce para a vida eterna…
Muito obrigado.”