A Secretaria de Estado da Justiça (Sejus) acaba de divulgar o relatório do mês de agosto do Sistema Penitenciário Capixaba. Todos os meses a Sejus divulga um relatório, prática que começou a ser implantada em janeiro de 2011. O relatório traz dados interessantes para uma análise mais científica e que colocam em questionamento o discurso oficial do governo capixaba, que há mais de duas décadas imputa ao uso e ao tráfico de drogas a responsabilidade por pelo menos 80% dos homicídios ocorridos no Estado.
Informa o relatório que, de 1° a 31 de agosto deste ano, entraram nos presídios localizados na Grande Vitória 604 pessoas acusadas de diversos crimes. Deste total, 234 pessoas (ou seja, 38,74%) foram parar na cadeia por tráfico ou associação ao tráfico. No mesmo período, a polícia capixaba prendeu somente 45 homicidas, representando 7,45% do total de 604 pessoas presas.
Na Macrorregião Noroeste, no mês de agosto, deram entrada no sistema prisional 118 pessoas. De acordo com a Sejus, 50 são acusadas de tráfico ou por associação ao tráfico, o que representa 42,37%. Nessa macrorregião foram presos 14 homicidas, representando um total de 11,86%.
Já na Macrorregião Norte, a polícia prendeu de 1° a 31 de agosto 49 pessoas, sendo 18 acusadas de tráfico (35,73%) e seis supostos assassinos (12,24%). Finalizando, na Macrorregião Sul foram presas 16 pessoas: 12 acusadas de tráfico ou associação ao tráfico (75%) e dois suspeitos de homicídio (12,50%).
O gráfico consolidado por tipificação penal até 31 de agosto da Sejus informa que há no sistema 6.866 pessoas cumprindo pena. Somente 8,45% – ou seja, 580 – são homicidas, enquanto 2.195 (31,97%) são traficantes.
Os números são quase que idênticos em meses anteriores. Em julho, 30,94% da população carcerária era formada por traficantes; contra 8,44% de homicidas. O relatório mensal da Sejus traz outros dados importantes, mas esta postagem vai se ater somente a um dos itens do quesito “Evolução, Distribuição e Tipificação da População Carcerária Capixaba”.
Os dados nos obrigam a questionar – não no sentido de duvidar, mas de forçar a uma análise que poderá provocar, quem sabe, até mudança de postura – o discurso que as autoridades públicas do Estado adotam há pelo menos 20 anos. A justificativa para deixar o Espírito Santo sempre no topo de um dos estados mais violentos da federação é a mesma: o tráfico de droga é responsável por pelo menos 80% dos homicídios.
Se essa premissa é verdadeira, como explicar que os assassinatos estão sempre em alta se quase 32% da população carcerária do Estado é formada por traficantes ou pessoas que se associaram ao tráfico?
Por que, se os assassinatos são o grande calcanhar de Aquiles de todos os governantes capixabas desde a década de 70, se prende mais acusados de tráfico do que homicida? A polícia não tem um foco? Não tem prioridade?
Se mesmo com a prisão de traficantes os homicídios continuam a acontecer em grande escala, quem está matando? Só um lembrete: de 1° de janeiro deste ano até hoje (27/09), a Secretaria de Estado da Segurança Pública e Defesa Social registrou em seu site 1.283 assassinatos. No mesmo período de 2010, foram 1.381 homicídios, uma diferença de 98 mortes.
Será que, mesmo de dentro das prisões, os traficantes – que formam a maior população carcerária do Estado – é que dão ordem para os assassinatos?
E quem seriam esses traficantes e quem são as pessoas que se associam ao tráfico que estão presas? Não seriam simples “soldados” dos verdadeiros chefões? Será que os cabeças do tráfico, aqueles que mandam matar, estão mesmo na prisão?
São questionamentos que devem ser feitos por nossas autoridades, a partir de informações divulgadas pelo próprio governo do Estado, por intermédio de sua Secretaria de Justiça.